Diário da República n.º 70, Série I de 2014-04-09
Decreto-Lei n.º 55/2014
Fundo da Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético
Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia
Diploma
Cria o Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético
Preâmbulo
Tendo em consideração a atual conjuntura económica e financeira do País, considera-se que o setor energético também deve participar, numa ótica de repartição justa e equitativa de sacrifícios, no esforço de consolidação das contas públicas que tem sido exigido à sociedade portuguesa. Esta participação, contudo não deve pôr em causa este importante vetor da economia portuguesa e pilar fundamental para o crescimento e desenvolvimento sustentável do país.
Assim, no âmbito dos compromissos assumidos no Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica celebrado, em maio de 2011, entre o Estado Português, o Fundo Monetário Internacional, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu, o artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2014, veio criar a contribuição extraordinária sobre o setor energético, com o objetivo de financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do setor energético, designadamente através do financiamento de políticas do setor energético de cariz social e ambiental, de medidas relacionadas com a eficiência energética. Esta contribuição visa igualmente contribuir para a redução da dívida tarifária do Sistema Elétrico Nacional (SEN), designadamente, através da minimização dos encargos decorrentes de custos de interesse económico geral (CIEG), indo ao encontro dos princípios de apoio e proteção do consumidor de eletricidade decorrentes do Terceiro Pacote da Energia da União Europeia consubstanciado nas Diretivas n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, e n.º 2009/73/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009. Para o efeito, foi determinada a consignação da receita obtida com a contribuição extraordinária sobre o setor energético ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético (FSSSE), a criar no prazo de 60 dias a contar da entrada em vigor da referida lei.
Foi ouvida a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º - Objeto e natureza
1 – O presente decreto-lei cria, no âmbito do Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, o Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético, doravante designado por FSSSE.
2 – O FSSSE tem a natureza de património autónomo, sem personalidade jurídica e com autonomia administrativa e financeira.
Artigo 2.º - Objetivos
O FSSSE visa contribuir para a promoção do equilíbrio e sustentabilidade sistémica do setor energético e da política energética nacional, designadamente através:
a) Do financiamento de políticas do setor energético de cariz social e ambiental, relacionadas com medidas de eficiência energética;
b) Da redução da dívida tarifária do Sistema Elétrico Nacional (SEN), mediante a receita obtida com a contribuição extraordinária sobre o setor energético prevista no artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro.
Artigo 3.º - Receitas
1 – Constituem receitas do FSSSE:
a) O produto da contribuição extraordinária sobre o setor energético prevista no artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro;
b) As dotações que lhe sejam afetas por lei;
c) Os rendimentos provenientes de aplicações financeiras de capitais disponíveis;
d) O produto de doações, heranças, legados ou qualquer outra contribuição;
e) Quaisquer outras receitas que lhe sejam atribuídas por lei ou por negócio jurídico.
2 – Os saldos que vierem a ser apurados no fim do ano económico transitam para o ano seguinte.
3 – É vedado ao FSSSE contrair empréstimos sob qualquer forma bem como efetuar aplicações em que o capital investido não seja totalmente garantido.
4 – O disposto no número anterior não prejudica a aplicação dos mecanismos de redução de dívida tarifária previstos no artigo 5.º.
5 – Os montantes arrecadados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) em cada mês, a título de contribuição extraordinária sobre o setor energético, são transferidos para o FSSSE até ao último dia útil do mês seguinte.
Artigo 4.º - Despesas
1 – Constituem despesas do FSSSE as que resultem de encargos decorrentes da aplicação do presente decreto-lei, designadamente:
a) Encargos necessários ou decorrentes da realização dos seus objetivos, conforme definidos no artigo 2.º;
b) Encargos de liquidação e cobrança da contribuição extraordinária sobre o setor energético incorridos pela AT, correspondentes a uma percentagem de 3% da receita referida na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior.
2 – As verbas do FSSSE devem ser alocadas de acordo com a seguinte ordem de prioridade:
a) Cobertura de encargos decorrentes da realização do objetivo definido na alínea a) do artigo 2.º no montante correspondente a dois terços da receita referida na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, até ao limite máximo de EUR 100 000 000,00;
b) Cobertura de encargos decorrentes da realização do objetivo definido na alínea b) do artigo 2.º no montante remanescente.
3 – O montante referido na alínea a) do número anterior inclui o montante referido na alínea b) do n.º 1.
Artigo 5.º - Redução da dívida tarifária
1 – Para a prossecução dos objetivos referidos na alínea b) do artigo 2.º, o montante definido na alínea b) do n.º 2 do artigo anterior é deduzido aos custos de interesse económico geral (CIEG) a repercutir em cada ano na tarifa de uso global do sistema aplicável aos clientes finais e comercializadores, em conformidade com o disposto no número seguinte.
2 – A repartição pelos CIEG do montante a deduzir nos termos do número anterior é definida por despacho do membro do Governo responsável pela área da energia.
3 – O FSSSE pode ainda proceder à aquisição de créditos tarifários aos respetivos titulares.
4 – Para efeitos do número anterior, entende-se por crédito tarifário o direito de receber, através das tarifas da eletricidade, os montantes relativos aos valores ou direitos correspondentes ao diferencial de custos que não forem repercutidos, no ano a que respeitam, dando origem a ajustamentos, diferimentos ou dívida de natureza tarifária, incluindo designadamente as seguintes rubricas:
a) Diferimentos tarifários estabelecidos no âmbito do Decreto-Lei n.º 165/2008, de 21 de agosto;
b) Défice tarifário associado à limitação dos acréscimos tarifários de baixa tensão em 2006;
c) Défice tarifário associado à limitação dos acréscimos tarifários de baixa tensão em 2007;
d) Ajustamentos tarifários respeitantes ao diferencial de custo com a aquisição de eletricidade aos produtores com contratos de aquisição de energia incluídos nos custos do uso global do sistema;
e) Ajustamentos tarifários respeitantes aos diferenciais de custo com a aquisição de energia aos produtores em regime especial;
f) Diferimentos tarifários dos sobrecustos com a aquisição de energia aos produtores em regime especial, determinados nos termos do artigo 73.º-A do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 104/2010, de 29 de setembro, 78/2011, de 20 de junho, 75/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio, e 215-A/2012, de 8 de outubro;
g) Ajustamentos tarifários definidos na atividade de uso global do sistema do sistema do operador da rede de transporte que incluam custos relacionados com o regime de interruptibilidade;
h) Ajustamentos tarifários das atividades reguladas da entidade concessionária do transporte e distribuidor vinculado da Região Autónoma da Madeira com incidência nos custos da convergência tarifária com as regiões autónomas suportada pelos consumidores de Portugal continental;
i) Ajustamentos tarifários das atividades reguladas da entidade concessionária do transporte e distribuição da Região Autónoma dos Açores com incidência nos custos da convergência tarifária com as regiões autónomas suportada pelos consumidores de Portugal continental;
j) Ajustamentos respeitantes à sustentabilidade entre o mercado livre e o mercado regulado nos termos do Regulamento Tarifário da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), com origem em exercícios tarifários anteriores;
k) Acertos de faturação, a recuperar pelo operador da rede de distribuição, no âmbito da parcela fixa e da parcela de acerto dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual.
5 – As entidades gestoras do FSSSE apenas podem intervir na aquisição de créditos a que se refere o n.º 3 depois de autorizadas mediante despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da energia, ouvida a ERSE.
6 – A decisão de aquisição de créditos a que se refere o n.º 3 deve observar os princípios da minimização dos encargos com diferimentos tarifários na perspetiva do SEN, da transparência e da separação contabilística.
7 – As entidades gestoras do FSSSE podem propor a extinção dos créditos adquiridos nos termos do n.º 3, com fundamento na inconveniência da sua efetiva cobrança, quando concluam que o interesse em diminuir a dívida tarifária existente prevalece sobre o interesse da cobrança efetiva dos créditos aos consumidores.
8 – Os membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da energia podem, por despacho e após parecer da ERSE, decidir extinguir os créditos adquiridos nos termos do n.º 3.
Artigo 6.º - Entidades gestoras
1 – A gestão do FSSSE é atribuída:
a) À Direção-Geral de Energia e Geologia, na vertente técnica;
b) À Direção-Geral do Tesouro, na vertente financeira.
2 – A regulamentação necessária à gestão do FSSSE é aprovada por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da energia.
Artigo 7.º - Competências das entidades gestoras
1 – Compete às entidades gestoras:
a) Assegurar o regular funcionamento do FSSSE;
b) Decidir sobre as aplicações dos recursos financeiros do FSSSE, em cumprimento das orientações dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da energia;
c) Elaborar a conta de gerência do FSSSE;
d) Elaborar o plano de atividades e orçamento do FSSSE;
e) Promover a criação, manutenção e gestão de uma conta exclusivamente destinada ao recebimento dos montantes transferidos pelo Estado nos termos previstos na Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro de 2013, e às transferências a efetuar ao abrigo do disposto no artigo 4.º;
f) Apoiar o Governo, sempre que para tal seja solicitada, na definição de estratégias e na prossecução de atuações que contribuam para a defesa e sustentabilidade do setor energético;
g) Desenvolver as ações necessárias para cumprimento dos objetivos do FSSSE.
2 – As entidades gestoras podem encarregar algum ou alguns dos seus trabalhadores ou dirigentes do desempenho permanente de atividades que tenham a ver com a gestão ou o funcionamento do FSSSE.
Artigo 8.º - Apoio técnico, administrativo e logístico
1 – O apoio técnico, administrativo e logístico necessário ao funcionamento do FSSSE e aos seus órgãos é assegurado pela Direção-Geral de Energia e Geologia.
2 – O FSSSE funciona em instalações para o efeito disponibilizadas pela Direção-Geral da Energia e Geologia.
3 – O FSSSE não possui mapa de pessoal.
Artigo 9.º - Avaliação do Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Setor Energético
Os membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da energia avaliam, passado um ano sobre a entrada em vigor do presente decreto-lei, os pressupostos que justificaram a constituição do FSSSE.
Artigo 10.º - Fiscalização
1 – Cabe à Inspeção-Geral de Finanças, doravante designada IGF, assegurar o permanente acompanhamento do cumprimento do estatuído no presente decreto-lei, sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades encarregues da inspeção e auditoria dos serviços do Estado.
2 – Para efeitos do número anterior, a IGF deve, designadamente, proceder:
a) A auditorias, inspeções e outras ações de controlo à atividade do FSSSE, incluindo uma auditoria anual à sua gestão;
b) A ações de inspeção junto das entidades financiadas pelo FSSSE.