Doutrina Administrativa
Tributação do património : IS

Processo n.º 2014003080

 

Assunto
Locação financeira imobiliária e participação da transmissão gratuita
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 15 de Janeiro, 2015
Número: 2014003080
Diploma: CIS
Artigo: 26.º

Doutrina

Locação financeira imobiliária e participação da transmissão gratuita

Nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária foi apresentado um pedido de informação vinculativa, sobre se na situação de dissolução do vínculo matrimonial (constituído no regime da comunhão de adquiridos), por decesso de cônjuge não locatário na pendência de contrato de locação financeira imobiliária, outorgado apenas pelo cônjuge sobrevivo, o direito à locação e respetiva perspetiva de aquisição, se consideram parte do acervo patrimonial comum.

I – ENQUADRAMENTO FACTUAL
Nos termos do contrato de locação financeira imobiliária, com duração de 180 meses, com termo em 2014, firmado entre o requerente na posição de locatário e a instituição financeira YYY como locadora, foi pela segunda cedido o uso do imóvel destinado a escritório, tendo sido clausulada a possibilidade de opção de compra, pelo primeiro, no termo do contrato.

Em 2013, ocorreu o óbito do cônjuge não locatário.

Visando a aquisição do imóvel em consequência da opção exercida, o requerente solicitou, junto do serviço de finanças, a emissão de DUC atestando a liquidação do IMT.

A entidade locadora informou o seu cliente (e locatário) de que para a outorga da escritura de compra e venda, deveria providenciar os seguintes elementos: assento de nascimento do cônjuge falecido; relação completa de bens às Finanças; guias de IMT e Imposto do selo pela opção de compra, emitidas em nome da herança (com o NIF de herança); documento de identificação da outra herdeira e confirmação do estado civil dos herdeiros.

Considera a entidade locadora que atento o regime de bens do casamento, o direito à locação e respetiva expectativa de aquisição, integram o acervo patrimonial comum.

II – ANÁLISE
O requerente pretende saber se o direito à locação e respetiva expectativa de aquisição pertencem ao acervo patrimonial comum, e em caso de resposta afirmativa, se devem ser objeto de participação de transmissão gratuita.

Nos termos do preceituado no artigo 1.º do DL n.º 149/95, de 24 de junho, Locação Financeira é «o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados».

São elementos do contrato de locação financeira, a cedência do gozo temporário de uma coisa pelo locador, a aquisição ou construção dessa coisa por indicação do locatário, a retribuição correspondente à cedência e a possibilidade de compra total ou parcial, por parte do locatário.

O locador conserva a propriedade plena da coisa, sendo a compra pelo locatário no final do contrato, meramente opcional (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães no processo 593/07-1). O locatário dispõe de uma expectativa de aquisição, que se consubstancia num direito potestativo de aquisição, a exercer, caso pretenda, no termo do contrato de locação, através da celebração de um contrato de compra da coisa até então locada.

Dispõe o artigo 2031.º do C.C (Código Civil) que, «A sucessão abre-se no momento da morte do seu autor...», sendo pois esse, o momento em que se estabiliza e define o acervo hereditário a partilhar.

Na vertente situação, à data do decesso do cônjuge não locatário, decorria ainda o contrato de locação, usufruindo o locatário do gozo do bem locado, mediante o pagamento de uma retribuição (a renda) ao locador, proprietário do bem.

Para efeitos de sujeição a imposto do selo sobre as transmissões gratuitas, há que atentar no disposto no artigo 1.º do CIS, relativo à incidência objetiva.

A relacionação dos bens e ou direitos, enquanto realidades suscetíveis de transmissão gratuita, tem por desiderato a sua sujeição a imposto do selo, pela verba 1.2 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS).

Antes de exercida a opção de compra, o que existe na esfera patrimonial do locatário financeiro é uma mera expectativa, um direito potestativo de, se assim o desejar, no termo do contrato de locação financeira, poder vir a celebrar um contrato de aquisição do bem até então locado.

Sem pretender dilucidar se tal expectativa faz parte do acervo comum do casal, por não ser esta a sede própria para a sua aferição, (uma vez que não compete ao direito fiscal a qualificação de determinada realidade como bem próprio ou comum, em razão do regime de bens adotado pelo matrimónio), por razões de pragmatismo, urge compreender se a mesma é ou não subsumível, para efeitos de tributação, à já mencionada verba 1.2 da TGIS.

Não se tratando de bem ou direito, suscetível de ser objeto de propriedade, nem tão pouco configurando um direito real menor, isto é, uma figura parcelar desse mesmo direito de propriedade, a factualidade apresentada não se revela passível de enquadramento em nenhuma das alíneas do n.º 3, do artigo 1.º do CIS, relativo à incidência objetiva.

III - CONCLUSÃO
À data do óbito do cônjuge não locatário, o bem imóvel em apreço, era pertença da entidade locadora e a expectativa de aquisição inerente à locação financeira, ainda que eventualmente e como mera hipótese académica, pudesse ser considerada como fazendo parte do acervo comum, por não se reconduzir a um bem, ou direito de propriedade ou a uma figura parcelar desse mesmo direito de propriedade - e como tal, objeto de numerus clausus, por imposição legal, como resulta do disposto no artigo 1306.º do C.C - encontra-se fora do âmbito de incidência da norma constante do n.º 3 do artigo 1.º do CIS, não devendo ser objeto de participação.