Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – Processo n.º 01083/22.8BESNT
3 de Janeiro, 2025
Sumário
I - A Derrama Estadual apresenta-se como um “imposto acessório” e não um “simples imposto dependente”, devido mesmo que o imposto principal, do qual depende, não o seja, pois que, como decorre do respectivo regime jurídico, a Derrama Estadual incide sobre parte do lucro tributável do imposto principal.
II - Por esse prisma, tendo em conta os contornos do caso em análise, ao fazer incidir a derrama estadual sobre o lucro tributável das empresas, estão sujeitas à mesma taxa de derrama estadual, contando que tenham o mesmo lucro, pelo que não é configurável nessa situação a ofensa do princípio da igualdade e da capacidade contributiva.
III - Tributar o lucro real das empresas significa atingir a matéria colectável auferida pelo sujeito passivo, pelo que a tributação do lucro real é, também, uma decorrência necessária do princípio da capacidade contributiva pelo que se trata de um princípio cuja principal concretização é afastar a tributação das empresas pelo seu lucro normal, isto é, tributar o rendimento que estas poderiam ter obtido em condições normais de exploração, independentemente, pois, das condições concretas em que desenvolveram a sua actividade, sendo, por isso, a tributação pelo lucro real um princípio que admite “desvios”, entenda-se, é compatível com alguma “normalização” no apuramento da matéria colectável.
IV - Por esse prisma, a progressividade encontra-se apenas prevista para o imposto sobre o rendimento pessoal, como um objectivo destacado da diminuição da desigualdade económica entre os cidadãos (artigo 104.º, n.º 1, da CRP), mas daí não resulta que esteja constitucionalmente vedado a um imposto incidente sobre as empresas um carácter progressivo, o que só por si não é susceptível de violar o princípio da igualdade, da capacidade contributiva ou da tributação segundo o rendimento real, não ocorrendo as arbitrariedades e inconstitucionalidade invocadas pela Recorrente por se tributar com taxas progressivas as ficções que são as sociedades comerciais.
V - Não ocorre a invocada inconstitucionalidade em razão do prolongamento injustificado da Derrama Estadual a período posterior à cessação dos motivos que estiveram subjacentes à sua criação pela Lei nº 12-A/2010, de 30.06, porquanto, em 2017, ainda se colocavam constrangimentos de política fiscal, determinados pela necessidade de consolidação orçamental, centrada na diminuição da despesa e no aumento da receita, e de redução dos níveis de endividamento público, assim se justificando que a Lei do Orçamento do Estado para 2018, não só não tenha abolido a Derrama Estadual, como tenha ainda procedido um agravamento fiscal, ao aumentar a taxa aplicável ao último escalão, que passou de 7% para 9%.
VI - Por assim ser, é manifesto que para o legislador pontificaram razões de política fiscal suficientes para legitimar manutenção da Derrama Estadual, o que afasta a violação do princípio da igualdade na vertente de proibição do arbítrio e, pela sua específica configuração, não afronta os princípios da capacidade contributiva, da protecção da confiança, da segurança jurídica.
VII - O regime de apuramento da base tributável da derrama estadual - mesmo no caso de empresas agrupadas - não é susceptível de pôr em causa as liberdades invocadas, na medida em que a decisão de coligação das empresas com vista à constituição de um grupo de empresas e, bem assim, a opção pela aplicabilidade do regime especial de tributação dos grupos de empresas (se cumpridos os requisitos de acesso) são decisões que se encontram na inteira disponibilidade dos operadores económicos envolvidos, não correspondendo a qualquer imposição estadual (ou outra).