Diploma

Diário da República n.º 22, Série I de 2016-02-02
Decreto Legislativo Regional n.º 4/2016/M, de 2 de fevereiro

Produção e comercialização de pão tradicional da Região Autónoma da Madeira

Emissor
Região Autónoma da Madeira - Assembleia Legislativa
Tipo: Decreto Legislativo Regional
Páginas: 0/0
Número: 4/2016/M
Publicação: 3 de Fevereiro, 2016
Disponibilização: 2 de Fevereiro, 2016
Estabelece o regime relativo à produção e comercialização de pão tradicional da Região Autónoma da Madeira

Diploma

Estabelece o regime relativo à produção e comercialização de pão tradicional da Região Autónoma da Madeira

Preâmbulo

Estabelece o regime relativo à produção e comercialização de pão tradicional da Região Autónoma da Madeira O Decreto-Lei n.º 65/92, de 23 de abril, veio estabelecer um novo quadro regulador a observar no fabrico, composição, acondicionamento, rotulagem e comercialização de farinhas, pão e outros produtos similares, remetendo, no seu artigo 1.º, para a publicação de uma portaria conjunta dos ministérios com competências nas áreas da agricultura, da saúde, do comércio e turismo e do ambiente e dos recursos naturais, a fixação das normas técnicas relativas à definição, caracterização, composição, acondicionamento, rotulagem, métodos de análise e tolerâncias analíticas a utilizar nas farinhas destinadas à panificação, a outros fins industriais e a usos culinários; sêmolas destinadas ao fabrico de massas alimentícias e a usos culinários; pão e produtos afins do pão; misturas pré-embaladas de aditivos, auxiliares tecnológicos e outros ingredientes, e leveduras destinadas ao fabrico de pão e dos produtos afins do pão.
Daquele dispositivo legal nuclear, ao longo do tempo foram sendo emanadas diversas portarias, designadamente a fixar as características a obedecer pelos diferentes tipos de pão e dos produtos afins do pão, a estabelecer as regras de rotulagem, acondicionamento, transporte, armazenagem e comercialização das farinhas destinadas a fins industriais e a usos culinários, bem como das sêmolas destinadas ao fabrico de massas alimentícias e a usos culinários, bem como as características, condições de fabrico, acondicionamento e rotulagem de determinadas farinhas, as farinhas corrigidas e compostas.
Esta regulamentação era muito restritiva sobretudo ao nível dos ingredientes autorizados, não considerando a especificidade de certa panificação, quer nacional quer das Regiões Autónomas, certamente porque, aquando do seu estabelecimento, os produtos da panificação de maior tradicionalidade tinham um circuito de comercialização, salvo raras exceções, diverso do atual, a maior parte das vezes circunscrito às proximidades dos locais de produção e focalizado no pequeno retalho envolvente.
Tal conceção limitada já não se adequava à realidade, visto que, cada vez mais era importante proteger e incentivar a produção, bem como o consumo, de produtos agroalimentares com comprovado caráter genuíno e valor civilizacional, os quais, além de elementos do património identitário e diferenciador de uma dada região, constituíam polos dinamizadores das pequenas economias locais com importante repercussão em vários setores de atividade.
Entretanto, a Portaria n.º 254/2003, de 19 de março, veio fixar as normas técnicas relativas à definição, caracterização, composição, acondicionamento, rotulagem, métodos de análise, tolerâncias analíticas e comercialização das farinhas destinadas à panificação e a outros fins e das sêmolas destinadas ao fabrico de massas alimentícias e a usos culinários, revogando o anterior dispositivo legal sobre a matéria, e a Lei n.º 75/2009, de 12 de agosto, estabelecer as normas com vista à redução do teor de sal no pão, e de nova informação na rotulagem de alimentos embalados destinados ao consumo humano.
Só muito mais tarde a Portaria n.º 52/2015, de 26 de fevereiro, veio revogar a Portaria n.º 425/98, de 25 de julho, que estabelecera as características a obedecer pelos diferentes tipos de pão e de produtos afins do pão, bem como a regular alguns aspetos da sua comercialização, reconhecendo estar aquela desatualizada, não só do ponto de vista tecnológico, mas também, porque algumas das matérias por si regulamentadas caíram em desuso, face a um conjunto de diplomas comunitários e nacionais que são aplicáveis a todos os géneros alimentícios.
A Portaria n.º 52/2015, de 26 de fevereiro, fixou então as características a que devem obedecer os diferentes tipos de pão e dos produtos afins do pão, caracterizando pela primeira vez, entre outros, o que é «Pão tradicional», «Pão artesanal» e «Pão biológico».
Este diploma define como «Pão tradicional» o pão cujos ingredientes, processos de fabrico e receita se mantêm comprovadamente inalterados há, pelo menos, 30 anos, havendo que adequar este conceito à realidade e interesses da Região Autónoma da Madeira. De facto, no seu espaço rural, mantém-se bem preservada a tradição secular do fabrico próprio de pão, seja para consumo familiar seja para troca mais alargada, sendo que este fenómeno vem adquirindo maior expressão, dinamizado por um número crescente de consumidores que valorizam cada vez mais as produções locais.
À parte das suas vicissitudes, da longa história cerealífera da Madeira e do Porto Santo, e da influência norte-africana que ficou inculcada, desde o século XV, à prática alimentar das suas populações, o pão que alcançou maior notoriedade e reputação é sem dúvida o «Bolo do caco», com uma forma achatada peculiar e cozido sobre um «caco», no passado, geralmente uma pedra de basalto e muito provavelmente, nos séculos XV e XVI, em base cerâmica.
Existem outras qualidades de pães que também fazem parte da cultura ancestral da Madeira e do Porto Santo, as quais, por assentarem num receituário base comum, podem ser agregadas sob a denominação genérica de «Pão de Casa».
Estes pães apresentam um denominador comum, o qual lhes confere atributos finais particulares e distintivos, que é o facto de incorporarem como um dos ingredientes a batata-doce (Ipomoea batatas L.). Outro fator diferenciador consiste em a sua cozedura ser realizada em fornos a lenha, alguns deles ainda construídos com «cantaria de forno», cantaria mole de cor vermelho acastanhado específica da ilha da Madeira, a qual corresponde aos tufos ou consolidações de lamas vulcânicas. Este material foi muito utilizado no fabrico de fogareiros e de aduelas de fornos, equipamentos estes geralmente de forma semicircular de abóbada troncada.
A receita base é composta da mistura de trigo, de fermento (de padeiro ou «massa lêveda»), de água e de sal, mas é a batata-doce que, inegavelmente, contribui para conferir o caráter distintivo do «Pão de Casa». De facto, este tubérculo imprime à massa do produto características sápidas e de aroma inconfundíveis, e o seu uso só poderia estar relacionado com a tradição, importância e disseminação desta cultura agrícola no território da Região Autónoma da Madeira, pelo menos desde o século XVII. Esta cultura veio precisamente permitir substituir parte do trigo que compunha a massa panar, cereal em paulatino declínio face à expressão que já obtivera em séculos anteriores, logo mais difícil, se não impossível, de obter e mais caro e, com várias vantagens, como proporcionar um maior usufruto, através de amassaduras mais frequentes, e mais ainda, permitir obter um produto de excelente qualidade e boa durabilidade.
Porém, o «Pão de Casa» apresenta uma maior ou menor variabilidade, de local para local, e de produtor para produtor.
Estas diferenças resultam, apenas e só, do saber fazer de cada produtor, ou seja, do modo como cada um interpreta e adapta a receita transmitida das gerações anteriores, designadamente ao nível da proporção entre os ingredientes base e/ou do processo e período de tempo para amassar, tender e cozer, o qual se reflete sobretudo na forma, e/ou nas características do miolo e da côdea do produto final.
Também, além do «Pão de Casa», é necessário preservar outros pães tradicionais de âmbito geográfico mais restrito, e associados diretamente a culturas agrícolas que só ali adquirem expressividade relevante, como é o caso do castanheiro, sendo que estes produtos agrícolas regionais podem substituir ou complementar a batata-doce na lista dos ingredientes base.

Assim:
A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira decreta, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa e na alínea c) do n.º 1 do artigo 37.º e na alínea g) do artigo 40.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de junho, na redação e numeração das Leis n.ºs 130/99, de 21 de agosto, e 12/2000, de 21 de junho, o seguinte: