Diploma

Diário da República n.º 68, Série I, de 2020-04-06
Decreto-Lei n.º 12/2020, de 6 de abril

Regime jurídico do comércio de gases com efeito de estufa

Emissor
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS
Tipo: Decreto-Lei
Páginas: 3/0
Número: 12/2020
Publicação: 22 de Abril, 2020
Disponibilização: 6 de Abril, 2020
Estabelece o regime jurídico aplicável ao comércio de licenças e emissão de gases com efeito de estufa, transpondo a Diretiva (UE) 2018/410

Diploma

Estabelece o regime jurídico aplicável ao comércio de licenças e emissão de gases com efeito de estufa, transpondo a Diretiva (UE) 2018/410

Preâmbulo

O combate às alterações climáticas constitui um dos maiores desafios da atualidade, no qual a União Europeia tem desempenhado um papel fundamental a nível mundial ao estabelecer metas e políticas ambientais de mitigação para o espaço europeu de extrema relevância. No quadro da política climática e da energia da União Europeia merece destaque o compromisso assumido pelo Conselho Europeu de outubro de 2014 de reduzir, até 2030, as emissões globais de gases com efeito de estufa (GEE) da União Europeia em, pelo menos, 40% em relação aos níveis registados em 1990. Com o objetivo de promover a transição para uma economia de baixo carbono, todos os setores da economia deverão contribuir para alcançar essa redução de emissões e esta meta será atingida da forma mais eficaz em termos de custos através do regime Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) que, até 2030, deve corresponder a uma redução de 43% em relação aos níveis de 2005.
Este compromisso está em linha com o Acordo de Paris adotado em dezembro de 2015 e que veio estabelecer objetivos de longo prazo de contenção do aumento da temperatura média global consideravelmente abaixo de 2º C em relação aos níveis pré-industriais, tendo-se registado um compromisso da comunidade internacional no sentido desenvolver esforços para que esse aumento não ultrapasse 1,5º C, de forma a reduzir significativamente os riscos e impactos das alterações climáticas.
Neste contexto, foi publicada a Diretiva (UE) 2018/410, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de março de 2018 (Diretiva CELE), que alterou a Diretiva 2003/87/CE, visando reforçar a relação custo-eficácia da redução de emissões e o investimento em tecnologias de baixo carbono e estabelecer as regras para o quarto período CELE de 2021 a 2030.
Para o período com início a 2021, que agora se regula, destaca-se, em primeiro lugar, a diminuição, de forma mais acentuada, da quantidade de licenças de emissão emitidas anualmente no conjunto da União Europeia, através da alteração do fator de redução linear de 1,74% para 2,2% a partir de 2021, como mecanismo para atingir as metas de redução de GEE estabelecidas para 2030.
A nova Diretiva CELE prevê, igualmente, que a venda em leilão de licenças de emissão continue a ser a regra geral, com a quota-parte a manter-se em 57%, constituindo a atribuição gratuita a exceção.
Ainda no que respeita ao mercado de carbono, torna-se operacional a reserva de estabilização de mercado.
No âmbito da atribuição gratuita de licenças de emissão, é relevante a existência de dois períodos de atribuição, de 2021 a 2025 e de 2026 a 2030, e para os quais serão determinados os montantes de licenças de emissão gratuitas a atribuir a cada instalação. A obrigação prevista no n.º 1 do artigo 11.º da Diretiva CELE determina a apresentação à Comissão Europeia da lista das instalações abrangidas pelo regime CELE em cada um dos períodos de atribuição, designada por Lista NIMs (National Implementation Measures). A lista relativa ao primeiro período de atribuição foi elaborada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2019, de 18 de janeiro, que procedeu à transposição parcial da Diretiva CELE e regulou o procedimento relativo ao pedido de atribuição de licenças de emissão a título gratuito para o período de atribuição 2021 a 2025 e respetiva submissão à Comissão Europeia até 30 de setembro de 2019.
É importante salientar que as regras de atribuição de licenças de emissão a título gratuito foram revistas para o quarto período CELE, encontrando-se consagradas no Regulamento Delegado (UE) 2019/331, da Comissão, de 19 de dezembro de 2018, sobre a determinação das regras transitórias da União Europeia relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.º-A da nova Diretiva CELE.
Neste contexto, mantém-se o recurso a parâmetros de referência ex ante (benchmarks), definidos a nível da União Europeia, de forma a assegurar que a atribuição de licenças de emissão a título gratuito ocorre de um modo que incentive a redução de GEE e técnicas energéticas eficientes.
Mantém-se também a regra de redução da quantidade de licenças de emissão a atribuir a título gratuito ao longo do período CELE, a qual corresponde, a partir de 2021 e até 2026, a 30% da quantidade preliminar determinada no âmbito do procedimento de atribuição gratuita. Após 2026, à exceção do aquecimento urbano, será reduzida em quantidades iguais, a fim de se eliminar completamente a atribuição de licenças de emissão a título gratuito até 2030.
Excetuam-se da regra referida os setores e subsetores considerados expostos a risco significativo de fuga de carbono, para os quais a quantidade de licenças de emissão a atribuir a título gratuito corresponde a 100% da quantidade preliminar. Esta medida, em vigor desde 2013, visa evitar o risco real de aumento das emissões de GEE em países terceiros onde a indústria não se encontra sujeita a políticas ambientais restritivas.
A não atribuição de licenças de emissão a título gratuito à produção de eletricidade, bem como à captura, transporte e armazenamento de dióxido de carbono (CO2), continua a manter-se após 2020.
A partir de 2021, as regras de ajuste dos montantes anuais de licenças de emissão a atribuir a título gratuito em função dos níveis de produção são alteradas significativamente, de forma a obter um melhor alinhamento com os níveis de produção anuais, passando o ajuste a ser efetuado de um modo simétrico, tendo em conta tanto os aumentos como as diminuições de produção relevantes.
Estabelece-se a obrigação dos operadores, que apresentem um pedido de atribuição de licenças de emissão a título gratuito, serem detentores de um plano metodológico de monitorização, aprovado e emitido pela autoridade competente. Este plano deve conter a metodologia de monitorização dos níveis de atividade a aplicar no âmbito da determinação da quantidade de licenças de emissão a atribuir a título gratuito, bem como da comunicação anual dos níveis de atividade.
A figura da exclusão do regime CELE de pequenas instalações que emitam menos de 25 000 tCO2 equivalente, desde que sujeitas a medidas que permitam uma contribuição equivalente de redução de emissões, encontrava-se já prevista desde 2013 na Diretiva CELE cabendo ao Estado-Membro estabelecer o procedimento a nível nacional, caso pretendesse operacionalizar a medida. Com a nova Diretiva CELE, esta opção é complementada com a possibilidade de, a partir de 2021, excluir instalações que emitam menos de 2500 tCO2 equivalente sem que sejam sujeitas a qualquer medida equivalente.
Assim, sendo a realidade nacional caracterizada por um elevado número de instalações que podem ser excluídas do regime CELE ao abrigo deste medida, e face à expressão marginal que representam para o quantitativo global de emissões, o presente decreto-lei vem regular a exclusão opcional de instalações para o quarto período CELE, estabelecendo como medida equivalente a definição de valores máximos de emissões anuais de CO2 equivalente que decrescem linearmente ao longo do período, de forma a atingir, em 2030, uma redução de 43% face às emissões de 2005.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira e a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários.
Foi promovida a audição dos órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores.

Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

ANEXO I - Gases com efeito de estufa

[a que se referem o n.º 1 do artigo 2.º, as alíneas c) e q) do artigo 3.º e o n.º 1 do artigo 8.º]
Gases com efeito de estufa

Dióxido de carbono (CO2).
Metano (CH4).
Óxido nitroso (N2O)
Hidrofluorocarbonetos (HFC).
Perfluorocarbonetos (PFC).
Hexafluoreto de enxofre (SF6).

ANEXO II - Atividades do sistema Comércio Europeu de Licenças de Emissão

[a que se referem o n.º 1 do artigo 2.º, as alíneas d), e), g) e k) do artigo 3.º, o n.º 1 do artigo 6.º, a alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º, o n.º 2 do artigo 26.º, a alínea b) do n.º 1 do artigo 27.º, o n.º 2 do artigo 28.º, os n.ºs 6 e 8 do artigo 30.º, o n.º 1 do artigo 32.º e o n.º 1 do artigo 41.º]
Atividades do sistema Comércio Europeu de Licenças de Emissão
Atividades Gases com Efeito de Estufa
1 Combustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW (excluem-se as instalações de incineração de resíduos perigosos ou resíduos urbanos independentemente da potência térmica nominal). Dióxido de carbono.
2 Refinação de óleos minerais Dióxido de carbono.
3 Produção de coque Dióxido de carbono.
4 Instalações de ustulação ou sinterização de minério metálico (incluindo de minério sulfurado), incluindo peletização. Dióxido de carbono.
5 Produção de gusa ou aço (fusão primária ou secundária), incluindo vazamento contínuo, com uma capacidade superior a 2,5 toneladas por hora. Dióxido de carbono.
6 Produção ou transformação de metais ferrosos (incluindo ligas de ferro) quando são explorados equipamentos de combustão com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW. A transformação inclui, nomeadamente, laminadores, reaquecedores, fornos de recozimento, ferrarias, fundições, equipamentos de revestimento e de decapagem. Dióxido de carbono.
7 Produção de alumínio primário Dióxido de carbono e perfluorocarbonetos.
8 Produção de alumínio secundário quando são explorados equipamentos de combustão com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW. Dióxido de carbono.
9 Produção ou transformação de metais não ferrosos, incluindo produção de ligas, refinação, moldagem em fundição, etc., quando são explorados equipamentos de combustão com uma potência térmica nominal total (incluindo combustíveis utilizados como agentes redutores) superior a 20 MW. Dióxido de carbono.
10 Produção de clínquer em fornos rotativos com uma capacidade de produção superior a 500 toneladas por dia, ou noutros tipos de fornos com uma capacidade de produção superior a 50 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
11 Produção de cal ou calcinação de dolomite e magnesite em fornos rotativos ou noutros tipos de fornos com uma capacidade de produção superior a 50 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
12 Produção de vidro, incluindo fibras de vidro, com uma capacidade de fusão superior a 20 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
13 Fabrico de produtos cerâmicos por cozedura, nomeadamente telhas, tijolos, tijolos refratários, ladrilhos, produtos de grés ou porcelanas, com uma capacidade de produção superior a 75 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
14 Fabrico de material isolante de lã mineral utilizando vidro, rocha ou escória com uma capacidade de fusão superior a 20 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
15 Secagem ou calcinação de gipsita ou produção de placas de gesso e outros produtos de gipsita, quando são explorados equipamentos de combustão com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW. Dióxido de carbono
16 Fabrico de pasta de papel a partir de madeira ou de outras substâncias fibrosas Dióxido de carbono.
17 Fabrico de papel ou cartão com uma capacidade de produção superior a 20 toneladas por dia. Dióxido de carbono
18 Produção de negro de fumo com carbonização de substâncias orgânicas, como os resíduos de óleos, alcatrões, craqueamento (cracker) e destilação, quando são explorados equipamentos de combustão com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW. Dióxido de carbono.
19 Produção de ácido nítrico Dióxido de carbono e óxido nitroso.
20 Produção de ácido adípico Dióxido de carbono e óxido nitroso.
21 Produção de glioxal e ácido glioxílico Dióxido de carbono e óxido nitroso.
22 Produção de amoníaco Dióxido de carbono.
23 Produção de produtos químicos orgânicos a granel por craqueamento, reformação, oxidação parcial ou completa ou processos similares, com uma capacidade de produção superior a 100 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
24 Produção de hidrogénio (H2) e gás de síntese por reformação ou oxidação parcial com uma capacidade de produção superior a 25 toneladas por dia. Dióxido de carbono.
25 Produção de carbonato de sódio anidro (Na2CO3) e bicarbonato de sódio (NaHCO3). Dióxido de carbono.
26 Captura de Gases com Efeito de Estufa (GEE) provenientes de instalações abrangidas pelo regime Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) para fins de transporte e armazenamento geológico num local de armazenamento permitido ao abrigo da Diretiva n.º 2009/31/CE. Dióxido de carbono.
27 Transporte de GEE por condutas para armazenamento geológico num local de armazenamento permitido ao abrigo da Diretiva n.º 2009/31/CE. Dióxido de carbono.
28 Armazenamento geológico de GEE num local de armazenamento permitido ao abrigo da Diretiva n.º 2009/31/CE. Dióxido de carbono.

1 – Os limiares de abrangência mencionados no quadro anterior referem-se, de um modo geral, a capacidades de produção ou a produtos.

2 – Se o mesmo operador exercer várias atividades da mesma rubrica na mesma instalação ou no mesmo sítio, as capacidades dessas atividades devem ser adicionadas.

3 – Quando se procede ao cálculo da potência térmica nominal total de uma instalação para determinar a inclusão da instalação no sistema CELE pela atividade de combustão de combustíveis, deve ser considerada a soma da potência térmica nominal de todos os equipamentos de combustão que fazem parte da mesma instalação.

4 – Os equipamentos referidos no número anterior incluem todo o tipo de caldeiras, queimadores, turbinas, aquecedores, fornos de recozimento, incineradoras, calcinadores, fornos, fogões, secadores, motores, células de combustível, equipamentos químicos de combustão, motores de queima de gases e equipamentos de pós-combustão térmica ou catalítica.

5 – Para efeitos do cálculo referido no n.º 3 não são tidos em conta os equipamentos com uma potência térmica nominal inferior a 3 MW e os equipamentos que utilizam exclusivamente biomassa.

6 – Os equipamentos que utilizam exclusivamente biomassa referidos no número anterior incluem os equipamentos que utilizam combustíveis fósseis apenas durante os arranques e paragens do equipamento.

7 – Se uma instalação desenvolve uma atividade em que o limiar de abrangência não é expresso como potência térmica nominal total, o limiar dessa atividade tem prioridade na decisão sobre a inclusão no sistema CELE.

8 – Quando o limiar de capacidade das atividades constantes do presente anexo é ultrapassado numa instalação, todos os equipamentos dessa instalação em que são queimados combustíveis, à exceção dos equipamentos de incineração de resíduos perigosos ou resíduos urbanos, devem ser incluídos no Título de Emissão de Gases com Efeito de Estufa.

ANEXO III - Definição dos valores máximos de emissões anuais de CO2 equivalentes no período entre 2021 e 2030 para as instalações excluídas do sistema Comércio Europeu de Licenças de Emissão ao abrigo do capítulo IV

(a que se refere o n.º 1 do artigo 28.º)
Definição dos valores máximos de emissões anuais de CO2 equivalentes no período entre 2021 e 2030 para as instalações excluídas do sistema Comércio Europeu de Licenças de Emissão ao abrigo do capítulo IV

Os valores máximos de emissões anuais de CO2 equivalentes são definidos por instalação e decrescem linearmente entre 2021 e 2030 mediante a aplicação do fator de 2,2%, referido no n.º 2 do artigo 11.º, de forma a se atingir uma redução de emissões de 43%, em 2030, em relação ao valor de emissões verificadas da instalação em 2005, conforme as percentagens de redução de emissões que se apresentam na tabela abaixo.
Na ausência de emissões verificadas da instalação de 2005, a medida equivalente deve atender ao valor de emissões verificadas do primeiro ano completo de funcionamento da instalação, considerando as regras de redução de emissões.

Redução de emissões, em percentagem, face às emissões do ano de 2005 durante o período 2021-2030
2021 2022 2023 2024 2025 2026 2027 2028 2029 2030
Redução de emissões (%) 23,2 25,4 27,6 29,8 32,0 34,2 36,4 38,6 40,8 43,0

ANEXO IV - Regras de simplificação da metodologia de monitorização de emissões de uma instalação excluída do regime Comércio Europeu de Licenças de Emissão ao abrigo do capítulo IV

1 – O operador de uma instalação excluída do regime Comércio Europeu de Licenças de Emissão ao abrigo do capítulo IV monitoriza as emissões da instalação de acordo com os requisitos estabelecidos no Regulamento (UE) n.º 601/2012, da Comissão, de 21 de junho de 2012 (Regulamento (UE) n.º 601/2012), e com as disposições de simplificação seguintes:
a) Dispensa da elaboração dos documentos comprovativos mencionados no terceiro parágrafo do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento (UE) n.º 601/2012;
b) Dispensa da estimativa da variação das existências prevista no artigo 27.º do Regulamento (UE) n.º 601/2012, podendo a quantidade de combustível ou de material ser determinada utilizando os registos de compra disponíveis e documentados;
c) Dispensa da apresentação de prova, prevista no n.º 1 do artigo 26.º do Regulamento (UE) n.º 601/2012, de que a aplicação de um nível mais elevado não é tecnicamente viável ou implica custos excessivos, podendo aplicar o nível 1 como nível mínimo para efeitos da determinação dos dados da atividade e dos fatores de cálculo em relação a todos os fluxos-fonte;
d) Dispensa do recurso a laboratório acreditado para efeitos da determinação dos fatores de cálculo com base em análises, previsto no artigo 32.º do Regulamento (UE) n.º 601/2012;
e) Dispensa do requisito de comunicação das melhorias previsto no artigo 69.º do Regulamento (UE) n.º 601/2012.

2 – As regras de simplificação referidas no número anterior não se aplicam às instalações que desenvolvem atividades que resultem na emissão de N2 O nos termos do anexo II ao presente decreto-lei.