Doutrina Administrativa
Tributação do consumo

Processo n.º 10177

 

Assunto
Enquadramento - Vendas, via internet, de peças de vestuário para entrega aos clientes situados noutros Estados Membros e fora do território aduaneiro da União; comprovativo do envio dos bens
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 31 de Março, 2016
Número: 10177
Diploma: RITI - CIVA
Artigo: 1.º; 3.º; n.º 1 do art. 6.º; nº.s 8 e 9 do art. 29.º. Art.s 7º, 10.º, 14º e 23º do RITI;

Doutrina

Enquadramento - Vendas, via internet, de peças de vestuário para entrega aos clientes situados noutros Estados Membros e fora do território aduaneiro da União; comprovativo do envio dos bens

A Requerente solicita informação vinculativa nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária (LGT) sobre o regime do IVA a aplicar às vendas, via internet, de peças de vestuário para entrega aos clientes situados noutros Estados Membros e fora do território aduaneiro da União bem como sobre o comprovativo do envio das mercadorias por via postal.

Em concreto, a Requerente, no exercício da sua atividade secundária, "COMÉRCIO A RETALHO POR CORRESPONDÊNCIA OU VIA INTERNET", CAE 047910, com enquadramento no regime normal do IVA, periodicidade trimestral, promove e vende peças de vestuário para mulher, procedendo à sua expedição para entrega dentro e fora do território aduaneiro da União.

Segundo a Requerente, as peças de vestuário são expedidas como encomendas por via postal, sem registo nem aviso de receção, ficando apenas com o recibo emitido pelas autoridades postais, constando nele o número de encomendas expedidas.

Sobre o assunto e tendo como factos certos a localização no território nacional do vendedor/transmitente e das peças de vestuário, cumpre informar nos seguintes termos:

A. Bens expedidos ou transportados para fora do território aduaneiro da União pelo vendedor/transmitente ou por um terceiro por conta deste

1. A venda de peças de vestuário fabricadas em Portugal consubstancia uma transmissão nos termos do artigo 3.º do Código do IVA (CIVA) sujeita a imposto, por força do disposto na alínea a) do no n.º 1 do artigo 1.º conjugada com o n.º 1 do artigo 6.º, do mesmo Código.

2. A expedição dos bens para fora do território aduaneiro da União configura uma exportação, que por ser um regime aduaneiro implica o cumprimento dos atos e formalidades previstas na regulamentação aduaneira, nomeadamente a entrega de uma declaração e a aplicação de medidas de política comercial a que as mercadorias podem estar sujeitas.

3. Dada a existência de uma previsão legal que prevê a isenção do IVA para as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora do território aduaneiro da União, as transmissões efetuadas pela Requerente podem ser isentas do IVA, por aplicação da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, se:
- o vendedor cumprir as formalidades previstas para o regime aduaneiro da exportação, nomeadamente se a declaração aduaneira for feita em seu nome, independentemente da corrente de tráfego a utilizar e da qualidade do destinatário.

4. Mas, há que atender ao disposto no n.º 8 do artigo 29.º do CIVA, segundo o qual as transmissões isentas ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do mesmo Código devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhe irá ser dado.

5. O n.º 9 do mesmo artigo 29.º do CIVA prevê que "A falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente."

6. Ora, se a exportação é um regime que impõe o cumprimento das formalidades previstas na legislação aduaneira, quer dizer que, para efeitos do n.º 8 do artigo 29.º, o vendedor/expedidor deve estar na posse do documento emitido nos termos da legislação aduaneira aplicável ao regime declarado, no qual conste a confirmação de saída da mercadoria do território da União.

7. Em matéria aduaneira, a Administração Tributária e Aduaneira (AT) apenas pode emitir informações pautais vinculativas (classificação pautal das mercadorias) ou informações vinculativas em matéria de origem, mediante pedido escrito e segundo as modalidades previstas de acordo com o procedimento do comité, conforme prevê o artigo 12.º do Código Aduaneiro Comunitário.

8. Com efeito, qualquer informação a prestar sobre procedimentos e formalidades a cumprir na exportação de bens ou sobre quem pode declarar as mercadorias à alfândega, apenas pode ocorrer pelos serviços competentes nas matérias, fora do âmbito do procedimento da informação vinculativa previsto na LGT.

9. Quer dizer que a informação a prestar apenas pode incidir sobre as regras do IVA, não podendo, contudo, proceder-se ao enquadramento da situação no âmbito do direito aduaneiro.

10. Nos termos daquela legislação, por enquadramento em determinadas condições e atendendo às normas de exclusão previstas, considera-se a declaração aduaneira como aceite e a autorização de saída como dada no momento da tomada a cargo da mercadoria pelas autoridades postais.

11. Pese embora não se poder concluir que tais expedições de bens para fora da União podem efetuar-se no âmbito do tráfego postal, importa, contudo, realçar, para efeitos do IVA, que a não certificação de saída, competência exclusiva das autoridades aduaneiras, impede o operador económico de comprovar as transmissões isentas ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, conforme impõe o n.º 8 do artigo 29.º do CIVA.

12. Por força do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA, o vendedor tem a obrigatoriedade de emitir uma fatura nos termos do artigo 36.º do mesmo Código, devendo nela indicar, para além de outras menções, o motivo justificativo da não liquidação do imposto, no caso: a "alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA".

13. Face ao explicitado, conclui-se que a confirmação da saída efetiva dos bens do território aduaneiro da União insere se no âmbito das competências das autoridades aduaneiras, devendo, por isso, a Requerente, na qualidade de transmitente/exportador, estar na posse de um documento no qual conste a certificação de saída nos termos da legislação aduaneira aplicável, para efeitos do disposto no n.º 8 do artigo 29.º do CIVA.

14. Sobre a exportação, vertentes aduaneira e do IVA, documentos de autorização e certificação de saída, referem-se a Circular n.º 8 /2015 e Ofício Circulado n.º 15327/2015, de 27 de julho e de 9 de janeiro, respetivamente, disponíveis no Portal das Finanças.

15. Como nota final, refere-se que as formalidades aduaneiras, nomeadamente, as declarativas podem ser cumpridas pelo dono das mercadorias. Sobre o assunto, pode a Requerente, caso entenda, solicitar informação junto da Direção de Serviços de Regulação Aduaneira mas fora do procedimento da informação vinculativa.

B. Transmissões de bens com destino a outro Estado-Membro

16. O envio de peças de vestuário para outro Estado-Membro consubstancia uma transmissão de bens intracomunitária, que pressupõe, necessariamente, o transporte dos mesmos de um Estado Membro para outro, sem a intervenção da alfândega, salvo se estiverem em causa veículos automóveis e bens sujeitos a impostos especiais sobre o consumo (IEC), o que não é o caso.

17. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 7.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI) "Considera-se transmissão de bens efetuada a título oneroso, para além das previstas no artigo 3.º do Código do IVA, a transferência de bens móveis corpóreos expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta, com destino a outro Estado membro, para as necessidades da sua empresa."

18. Prevê o artigo 10.º do RITI condições do regime específico das vendas à distância, em conformidade com o disposto nos artigos 33.º e 34.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006.

19. Considera-se venda à distância «encomenda feita por via postal, telecompras, internet ou outro processo) quando, entre outros requisitos, o sujeito passivo transmite bens móveis corpóreos expedidos ou transportados, por si ou por sua conta, com destino a um adquirente noutro Estado membro.».

20. Sobre vendas à distância localizadas fora do território nacional, dispõe o artigo 10.º do RITI:

"1 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º do Código do IVA não tem aplicação relativamente à transmissão de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta, a partir do território nacional, com destino a um adquirente estabelecido ou domiciliado noutro Estado membro quando se verifiquem, simultaneamente, as seguintes condições:

a) O adquirente não se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias no Estado membro de chegada da expedição ou transporte dos bens ou seja um particular;

b) Os bens não sejam meios de transporte novos, bens a instalar ou montar nos termos do n.º 1 do artigo 9.º nem bens sujeitos a impostos especiais de consumo;

c) O valor global, líquido do imposto sobre o valor acrescentado, das transmissões de bens efectuadas no ano civil anterior ou no ano civil em curso tenha excedido o montante a partir do qual são sujeitas a tributação no Estado membro de destino.

2 - Não obstante o disposto nas alíneas b) e c) do número anterior, não são igualmente tributáveis as transmissões de bens sujeitos a impostos especiais de consumo, expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta, a partir do território nacional, com destino a um particular domiciliado noutro Estado membro.

3 - Os sujeitos passivos referidos no n.º 1 cujas transmissões de bens não tenham excedido o montante aí mencionado podem optar pela sujeição a tributação no Estado membro de destino, devendo permanecer no regime por que optaram durante um período de dois anos.

4 - Se os bens a que se referem as transmissões previstas nos números anteriores forem expedidos ou transportados a partir de um país terceiro e importados pelo sujeito passivo nos termos do artigo 5.º do Código do IVA, considera-se que foram expedidos ou transportados a partir do território nacional."

21. Do preceito legal acima transcrito resulta que o vendedor pode (situação i), ou não (situação ii), liquidar IVA. Se:

i. o total das vendas efetuadas com destino ao Estado-Membro do adquirente, que verifique a condição prevista na alínea a) do n.º 1, não ultrapassar o limite aplicável nesse Estado Membro (por exemplo, o limite estabelecido na Alemanha é de €100 000; enquanto que em Espanha é de €35 000, limite igual ao aplicável em Portugal),
- a venda está sujeita a IVA no território nacional, tendo o transmitente de liquidar e debitar o imposto ao seu cliente, localizado noutro Estado-Membro, à taxa aqui aplicável.

ii. o total das vendas efetuadas com destino ao Estado-Membro do adquirente exceder o limite aplicável nesse EM, ou tenha optado pela sujeição do imposto no Estado-Membro de destino, deve, nesse caso, permanecer no regime por que optou durante um período de dois anos, face ao disposto no n.º 3 do artigo 10.º do RITI,
- a venda está sujeita a IVA no EM de chegada dos bens. Nesse caso, o vendedor, operador nacional, ao emitir a fatura deve liquidar o IVA à taxa aplicável nesse mesmo Estado-Membro, onde terá de entregar o imposto liquidado, podendo, para o efeito, registar-se ou designar um representante fiscal como devedor do imposto, nas condições e regras definidas nesse Estado-Membro (cf. artigo 24.º do RITI - corresponde no direito comunitário ao artigo 204.º da Diretiva 2006/112/CE).

22. Caso não se verifiquem aquelas condições, aplicam-se as regras gerais previstas na legislação IVA, importando destacar, seguidamente, a alínea a) do artigo 14.º do RITI que prevê a isenção do IVA para:

"a) As transmissões de bens, efetuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou coletiva registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado-Membro, que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;…)."

23. Partindo do pressuposto de que o atual enquadramento em sede de IVA permite ao Exponente/transmitente realizar transações intracomunitárias, isto é, o seu número de registo, para efeitos do IVA, é válido no Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o IVA (VIES) e as mercadorias objeto de venda não incluem as exceções ao regime, pode verificar-se uma de duas situações, dependendo da natureza do destinatário. No caso do destinatário, localizado noutro Estado-Membro, ser:

i. um sujeito passivo com número de registo, para efeitos do IVA, válido no VIES, o operador nacional (vendedor) realiza uma transmissão isenta ao abrigo do artigo 14.º do RITI, devendo cumprir as obrigações declarativas, nomeadamente enviar a correspondente declaração recapitulativa, por força do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do RITI.

ii. um particular ou um sujeito passivo com número IVA inválido no VIES, o vendedor realiza uma transmissão de bens sujeita a IVA no território nacional, devendo, assim, emitir uma fatura nos termos do artigo 36.º do CIVA e liquidar IVA à taxa aqui aplicável.

C. Transmissões de bens para entrega no território nacional

24. Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do CIVA conjugada com o n.º 1 do artigo 6.º e n.º 1 do artigo 3.º, do mesmo Código, estão sujeitas a IVA as transmissões de bens, considerando-se, como tal, a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade.

25. Nas transmissões de bens abrangidas pelo artigo 3.º do CIVA, a sujeição a imposto ocorre independentemente da natureza do adquirente, seja um operador económico que realiza a compra no exercício da sua atividade, ou qualquer outra pessoa, singular ou coletiva, que efetue tais operações.

26. Por força do disposto da alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA, o transmitente deve emitir uma fatura nos termos nos artigo 36.º do CIVA e, nela, proceder à liquidação do imposto à taxa aqui aplicável.