Doutrina Administrativa
Tributação do rendimento : IRC

Processo n.º 2018 001371

 

Assunto
Alteração (voluntária) de política contabilística: consequências fiscais
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 27 de Julho, 2018
Número: 2018 001371
Diploma: CIRC
Artigo: 18.º

Síntese Comentada

Esta informação vinculativa tem por objeto esclarecer as consequências fiscais da alteração voluntária de uma política contabilística que, segundo a IAS 8 – Políticas Contabilísticas, alterações das estimativas e erros, terá de ser aplicada retrospetivamente. Ao abrigo da IFRS 6 – Exploração e avaliação de recursos minerais, a entidade requerente tem capitalizado como ativos fixos[...]

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Doutrina

Alteração (voluntária) de política contabilística: consequências fiscais

A requerente pretende saber quais as consequências fiscais da alteração voluntária da política contabilística – a aplicar retrospetivamente – que tem vindo a adotar no reconhecimento dos dispêndios de pesquisa relacionados com estudos de geologia e geofísica e gastos gerais e administrativos.

1 - SITUAÇÃO DE FACTO
No âmbito da sua atividade e relativamente aos projetos de prospeção de recursos que se encontram, ainda, em fase de pesquisa, a requerente procede à contabilização dos dispêndios de exploração e avaliação de acordo com a International Financial Reporting Standards (IFRS) 6 - Exploração e avaliação de recursos minerais, adotando uma política de “Full cost accounting" com a variante de registo de imparidades sobre os ativos, em conformidade com a IFRS 6 e a IAS 36.

Assim, as despesas de pesquisa relacionadas com os referidos projetos têm vindo a ser contabilizadas como ativos tangíveis em curso.

Porém, tendo em conta que (i) a IFRS 6 prevê, em determinadas circunstâncias, a alteração voluntária da política contabilística definida na data da primeira adoção das IFRS, a requerente pretende passar a adotar uma política baseada em "Sucessful efforts", segundo a qual os dispêndios de pesquisa relacionados com estudos de geologia e geofísica e gastos gerais e administrativos são reconhecidos como gastos quando incorridos, entendendo que, para além de ser uma abordagem mais prudente, produz informação mais relevante e permite uma maior comparabilidade com as restantes empresas do setor em que se insere.

Tratando-se de uma alteração de política contabilística voluntária, esta terá de ser aplicada retrospetivamente de acordo com o disposto na IAS 8 – Políticas contabilísticas, alterações das estimativas e erros".

2 - ENTENDIMENTO SANCIONADO
Para efeitos de apuramento do lucro tributável em IRC, prescreve a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º do Código do IRC que a contabilidade deve estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas no Código.

A IFRS 6 integra a normalização contabilística a que apela o artigo 17.º do CIRC, pelo que é acolhido, em sede de IRC o tratamento que esta norma confere aos «dispêndios de exploração e avaliação de recursos minerais».

Segundo a referida norma, os dispêndios de exploração e avaliação são reconhecidos como ativos e classificados como tangíveis ou intangíveis de acordo com a natureza dos ativos adquiridos (método dos custos totais ou “full cost method"), devendo os mesmos ser avaliados quanto a imparidade quando os factos e circunstâncias sugerirem que a respetiva quantia escriturada pode exceder a sua quantia recuperável.

Por sua vez, a adoção da política contabilística alternativa (método sucessfull efforts), vai implicar que os referidos dispêndios de pesquisa que se enquadrem no âmbito do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC concorram para a formação do lucro tributável do período de tributação em que sejam suportados.

Com a aplicação retrospetiva da alteração da política contabilística é apurada uma variação patrimonial negativa cujo montante representa o somatório dos dispêndios de pesquisa relacionados com estudos de geologia e geofísica e gastos gerais e administrativos que se encontravam reconhecidos no ativo e cujo enquadramento fiscal obedece ao disposto no n.º 1 do artigo 24.º do Código do IRC.

Ora, este normativo estabelece que “Nas mesmas condições referidas para os gastos e perdas, concorrem para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não refletidas no resultado líquido do período de tributação" e afasta do regime as situações que se encontram enumeradas nas suas alíneas a) a f).

Ao ser utilizada a expressão “Nas mesmas condições referidas para os gastos e perdas", o legislador pretendeu acautelar, por exemplo, as situações como a descrita pela requerente, em que, por via de uma alteração de política contabilística voluntária, os dispêndios de pesquisa - associados a atividades de exploração e avaliação de recursos minerais - que tinham sido suportados ao longo dos anos e capitalizados ao abrigo da política recomendada pela IFRS 6 ("full cost method") vão ser agora transferidos para a conta #56 – Resultados transitados, gerando uma variação patrimonial negativa.

Se a empresa tivesse, desde logo, aplicado a política contabilística baseada no método "sucessfull efforts", os dispêndios de pesquisa tinham sido contabilisticamente reconhecidos como gastos quando incorridos, face ao regime do acréscimo, um dos pressupostos subjacentes à preparação e apresentação das demonstrações financeiras.

Este pressuposto está também presente na determinação do lucro tributável.

Com efeito, o n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRC faz apelo ao regime de periodização económica (ou do acréscimo) quando estabelece as regras gerais de periodização do lucro tributável.

Por conseguinte, esses gastos, se enquadráveis no âmbito do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, teriam concorrido negativamente para a formação do lucro tributável referente aos vários períodos de tributação em que foram suportados.

Por outro lado, a ser mantida a política contabilística que vem sendo adotada, o momento ou momentos de aceitação como gasto fiscal de tais dispêndios depende (i) ou do abandono do projeto (ii) ou do início da produção.

Nestes termos, a variação patrimonial negativa resultante da aplicação retrospetiva da alteração voluntária da política contabilística em causa terá de concorrer para a formação do lucro tributável “Nas mesmas condições referidas para os gastos e perdas".

Por esse facto, os dispêndios capitalizados ao longo dos anos e que vão ser reconhecidos a débito da conta # 56 – Resultados transitados não podem concorrer para a formação do lucro tributável do período em que a alteração da política contabilística for efetuada, mas sim para a formação do lucro tributável dos vários períodos de tributação em que foram, efetivamente, suportados.

3 - CONCLUSÃO
A desconsideração fiscal, no período de tributação em que for reconhecida, da variação patrimonial negativa decorrente da aplicação retrospetiva da alteração voluntária da política contabilística que vem sendo adotada na contabilização (como ativo) dos dispêndios de exploração e avaliação, e a consequente imputação destes dispêndios aos períodos de tributação em que foram suportados, obriga o sujeito passivo a apresentar declaração de substituição, no prazo previsto no n.º 2 do artigo 122.º do CIRC, se for caso disso, e a deduzir reclamações graciosas da autoliquidação, nos termos e prazos previstos no artigo 131.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.