Doutrina Administrativa
Benefícios Fiscais : EBF

Processo n.º 2020000134 – IVE n.º 17072

 

Assunto
Operação de Cisão - Reorganização de empresas em resultado de operações de restruturação ou de acordos de cooperação
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 25 de Março, 2020
Número: 2020000134 - IVE N.º 17072
Diploma: EBF
Artigo: 60.º

Síntese Comentada

Na cisão de uma empresa detentora de imóveis habitacionais, em que estes são transmitidos para a sociedade a criar resultante da dita cisão, a isenção de IMT e IS prevista no artigo 60.º do EBF depende da demonstração que os imóveis transmitidos sejam necessários à operação de reorganização, e exige ainda que eles estejam afetos[...]

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Doutrina

Operação de Cisão - Reorganização de empresas em resultado de operações de restruturação ou de acordos de cooperação

I - INTRODUÇÃO
1 - O presente pedido de informação vinculativa, visa clarificar o enquadramento jurídicotributário da operação de cisão a realizar pela Requerente, quanto à aplicação do artigo 60.º do EBF.

2 - Ou seja, uma vez que a totalidade dos imóveis (ainda que habitacionais) a transmitir estará afeta à atividade exercida, pela nova sociedade, a título principal – arrendamento de bens imobiliários –, à operação de cisão a levar a cabo pela Requerente, aplica-se a isenção prevista no n.º 1 do artigo 60.º do EBF, no que respeita aos impostos incidentes sobre a transmissão de imóveis e respetivos emolumentos legais – Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), Imposto do Selo (IS) e emolumentos?

II – INFORMAÇÃO
3 - As alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 60.º do EBF exigem, como pressuposto da isenção do IMT e de Imposto do Selo, que os imóveis transmitidos sejam necessários à operação de reorganização, mas, relativamente aos imóveis habitacionais, exige ainda que eles estejam afetos ao exercício da atividade principal.

4 - Além do âmbito de aplicação da cada um destes pressupostos ser diferenciado, eles também se distinguem pela sua própria natureza.

Com efeito,
5 - Enquanto o pressuposto da afetação dos imóveis habitacionais à atividade exercida a titulo principal deve ser avaliado no período temporal anterior à operação de reorganização, em função do objeto social e da atividade em concreto que vinha sendo exercida pela empresa, neste caso, a cindir;

6 - O pressuposto da necessidade da transmissão tem caráter prospetivo, voltado para o futuro, avaliando-se em função do papel que os imóveis transmitidos irão ter na empresa resultante da operação de reorganização empresarial. Assim, quer se tratem de transmissões de imóveis não habitacionais, quer se tratem de transmissões de imóveis habitacionais que estejam afetos à atividade exercida a título principal da empresa a reorganizar, a constituição do direito à isenção depende, em todos os casos, da verificação autónoma do requisito da necessidade de cada um dos imóveis a transmitir para os fins da operação de reorganização. Esta avaliação é sempre feita, a posteriori, em função da finalidade que cada imóvel irá desempenhar na entidade que resultar da reorganização empresarial.

Isto posto,
7 - De acordo com a lista fornecida, pela operação de cisão que a Requerente projeta realizar, serão transmitidos para a sociedade a constituir os seguintes imóveis:
• Prédio urbano, afeto a estacionamento coberto e fechado;
• Prédio urbano, afeto a habitação;
• Prédio urbano, afeto a habitação.

8 - Em face do até agora exposto, consideramos que à transmissão do prédio afeto a estacionamento coberto e fechado o pressuposto da afetação à atividade principal não se lhe aplica por se tratar de um imóvel não habitacional, ficando apenas por apurar, no futuro, e atendendo aos fins que o mesmo irá desempenhar na nova empresa, se o mesmo foi efetivamente necessário à operação de reestruturação.

9 - Já quanto aos dois imóveis habitacionais a questão é diferente, pois os mesmos não se encontram afetos à atividade exercida a título principal pela Requerente.

10 - Como antes dissemos este pressuposto da isenção deve ser avaliado em função da atividade exercida a título principal pela Requerente e não em função da atividade que irá ser desenvolvida pela sociedade resultante da cisão, onde se vão integrar os ativos a transmitir. É, portanto, um requisito acerca do passado e não um requisito acerca do futuro.

11 - Se atentarmos à atividade principal desenvolvida pela Requerente ela nada tem a ver com o exercício de atividades imobiliárias, razão principal da operação de cisão projetada e da constituição da nova sociedade que irá ter como atividade principal a gestão de atividades imobiliárias, consubstanciada no CAE 68200 – Arrendamento de bens imobiliários –, bem como, no CAE secundário 68100 – Compra e venda de bens imobiliários.

12 - Com efeito, por consulta ao SICAE, criado pelo Decreto-Lei n.º 247-B/2008, de 30 de dezembro, confirma-se que o CAE principal da Requerente - CAE esse que reflete a sua atividade principal e de maior importância-, nada tem a ver com o exercício de atividades imobiliárias (onde se inclui a atividade de arrendamento de bens imobiliários), cuja classificação integra especificamente a Secção L (Atividades imobiliárias) da CAE - REV 3, que aglomera genericamente as atividades de compra, venda, arrendamento, administração e mediação imobiliária.

13 - Fica assim patente a clivagem existente entre a atividade exercida a título principal pela Requerente e a atividade (imobiliária) que a empresa resultante da cisão projetada irá exercer.

14 - Pelo que, estando a atividade principal da Requerente enquadrada na Secção C (Indústrias transformadoras) e, especificamente, classificada no CAE 17290, nunca poderá ser considerado pelo intérprete, à luz dos critérios estabelecidos na CAE – REV 3, e das regras que norteiam a interpretação de normas que concedem benefícios fiscais, a atividade de arrendamento de bens imobiliários como a “atividade exercida a título principal", pela Requerente.

15 - Razão pela qual, na cisão projetada, a transmissão dos imóveis habitacionais identificados no pedido da Requerente, não cumprem o pressuposto da “atividade exercida a título principal", exigido pela isenção prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º do EBF.

16 - Acresce que, embora a Requerente afirme que os imóveis habitacionais foram adquiridos “Fruto do surgimento de oportunidades de negócio, bem como da necessidade de providenciar condições para os seus clientes, fornecedores, e ainda para atrair, localizar e reter colaboradores com skills específicas para o seu negócio", a verdade é que se tratou de uma aquisição, e posteriormente utilização, meramente instrumental, acessória e paralela à prossecução do seu objeto social, que é alcançado através do exercício normal da sua atividade principal.

17 - Ou seja, apesar de os possuir, estes imóveis habitacionais não são indispensáveis ao desempenho da sociedade a cindir, não integram o núcleo essencial da atividade empresarial da Requerente, pois estão afetos a uma atividade autónoma, distinta da sua atividade principal, consistindo a sua utilização – pelo menos até à data da cisão projetada –, numa mera fruição de bens limitada ao simples gozo da utilidade que emerge da sua existência.

18 - Este facto, é reconhecido pela própria Requerente que, na sequência da prestação de esclarecimentos adicionais, afirma que “até início de 2020, os imóveis foram utilizados para fruição da gerência, de colaboradores-chave da empresa e para disponibilização a clientes e fornecedores, sendo a utilização dos imóveis efetivamente gerida de forma autónoma à atividade industrial da Requerente. Não houve, até esta data, o exercício de uma atividade remunerada de gestão dos imóveis, com cobrança de rendas, por não haver na empresa um CAE que o permita – algo que se pretende com a operação em apreço. A partir de 2020, e com a criação de uma nova entidade com objeto social e CAE para este efeito, pretende-se que a cobrança de rendas seja uma realidade, ainda que possa servir propósitos semelhantes aos que ocorreram até 2019.

19 - Pelo que, também por este motivo, consideramos que na cisão projetada a transmissão dos imóveis habitacionais identificados no pedido da Requerente não cumpre o pressuposto da “atividade exercida a título principal", conforme exigido pela isenção prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º do EBF.

20 - Quanto à isenção dos emolumentos e outros encargos legais que se mostrem devidos pela prática dos atos inseridos no processo de reestruturação projetado, prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 60.º do EBF, face à alteração do paradigma na forma de reconhecimento das isenções aplicáveis às cisões simples, protagonizada pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, que deixaram de estar dependentes de reconhecimento prévio passando a ser de reconhecimento automático, resulta que foi transferida para os serviços de registo a competência para a verificação dos pressupostos da sua aplicação, no momento da prática dos respetivos atos.

21 - Assim sendo, uma vez que estamos perante uma taxa – o preço de um serviço a ser cobrado a título de retribuição pela entidade que o presta –, o esclarecimento sobre o eventual direito à isenção pertence às entidades com competência material para a sua liquidação e cobrança, no caso, o Instituto dos Registos e do Notariado.

III – CONCLUSÃO
Por regra, os sujeitos passivos que exerçam, diretamente e a título principal, uma atividade económica de natureza agrícola, comercial, industrial ou prestação de serviços, e se reorganizem em resultado de operações de reestruturação ou acordos de cooperação, podem beneficiar do reconhecimento automático das isenções, consagradas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 60.º do EBF, bastando para tal cumprir com o disposto no n.º 3 do artigo 19.º, conjugado com a alínea d) do n.º 8 do artigo 10.º, ambos do Código do IMT.

Perante o enquadramento da operação de cisão a realizar, e em consonância com tudo o que foi exposto, somente a transmissão do prédio afeto a estacionamento coberto e fechado – que, por se tratar de um imóvel não habitacional, não se lhe aplica o pressuposto da afetação à atividade principal –, poderá aproveitar do benefício fiscal consagrado nas alíneas a) e b), 1.ª parte, do n.º 1 do artigo 60.º do EBF.

Não obstante, a AT reserva-se no direito de, a posteriori, poder comprovar o preenchimento do requisito da necessidade da transmissão deste imóvel para os fins da operação de reorganização em causa.