Doutrina Administrativa
Tributação do consumo

Processo n.º 5108

 

Assunto
RBC - DT - Transmissões de bens efetuadas por meio de aparelhos de distribuição automática – Faturação – Registo das operações
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 23 de Agosto, 2013
Número: 5108
Diploma: Decreto-Lei n.º 147/2003
Artigo: 19.º, 40.º (CIVA). 1.º, 2.º, 4.º… (RBC)

Doutrina

RBC - DT - Transmissões de bens efetuadas por meio de aparelhos de distribuição automática – Faturação – Registo das operações

Tendo por referência o pedido de informação vinculativa solicitada, ao abrigo do art.º 68.º da Lei Geral Tributária (LGT), por « ….A…», presta-se a seguinte informação.

1. A requerente, enquadrada, em sede de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), no regime normal de tributação, de periodicidade mensal, pelo exercício, a título principal, da atividade de "comércio por grosso de bebidas não alcoólicas" e, a título secundário, da atividade de "comércio a retalho por outros métodos, não efectuado por estabelecimentos, bancas, feiras ou unidades móveis de venda", vem expor e requerer nos seguintes termos:
"Somos uma empresa que exerce a actividade de venda automática direccionada exclusivamente para o consumidor final, no qual não temos conhecimento dos dados fiscais dos adquirentes.
Assim, suscitam-nos dúvidas quanto ao novo quadro de operações de acordo com as últimas alterações introduzidas pelo D.L. 198/2012 no D.L 147/2003.
Passamos a descrever a actividade operacional:
O artigo quando sai do nosso armazém central, é transferido para o armazém viatura, entra em circulação acompanhado por uma guia global. A dúvida surge quando se retira os artigos da viatura e são colocados no armazém máquina que irá dar origem a uma potencial venda. […] A dúvida surge na verdade com ofício-circulado 50.000, de 26 de Janeiro, ponto 1.1, ou seja, quando se retira o artigo do armazém viatura para se colocar no armazém distribuidor automático de nossa propriedade. Nesta operação não existe uma venda, apenas se está a repor stocks para uma potencial venda ao consumidor final.
A alínea a) do ofício vem obrigar a realizar a entrega por documento de venda mas a mesma está dispensada. No ponto b), indica que também as guias ou qualquer outro tipo de documento que constituía documento de transporte tem de ser assinado, mas na verdade o que é necessário é um documento justificativo da retirada do artigo da viatura para o armazém distribuidor automático. No ponto 1.2, onde vem esclarecer e reforçar que devem ser assinados também qualquer outro tipo de documento que independentemente da sua designação, documentos que são susceptíveis de apresentação ao cliente para conferência de entrega de mercadoria ou da prestação de serviços, surge novamente a dúvida uma vez que se trata de um documento interno de transferência de armazém.
Posto isto, de acordo com o CIVA [Código do IVA], n.º 40, artigo 5, alínea b), fica o mesmo serviço dispensado de ser assinado e comunicado a AT, desde que seja cumprido um registo das suas operações.
Lembrando o decreto-lei 147/2003, de 11 de Julho, que refere que no caso de se ter de emitir um guia global, que é o nosso caso, que os movimentos que justificam a saída dos artigos da viatura, são; alínea a), que o cliente seja conhecido e exista uma entrega efectiva de bens, deve ser emitido um documento em duplicado para justificar a transmissão de bens, ficando o duplicado em nossa posse, alínea b), no caso de bens a incorporar em serviços prestados pelo remetente dos mesmos, deve a mesma ser registado em documento próprio, nomeadamente folha de obra, ou qualquer outro documento equivalente. Resumindo, o que estamos a realizar é uma transferência de armazém, repondo o stock do distribuidor automático, que irá produzir um produto composto, por vários artigos, […] que será vendido como um serviço, e cobrado o IVA de um serviço. […] Por último, no nosso caso quando transferimos o stock para o armazém máquina não temos a certeza absoluta de que o artigo composto irá ser vendido, sendo que pode representar uma perda quando este não é vendido. Agradecíamos da nossa parte um parecer vinculativo para que possamos continuar a elaborar a nossa actividade dentro das normas imperativas legais." .

2. Antes de mais importa esclarecer que, relativamente às questões formuladas pela requerente, as matérias decorrentes da publicação do ofício-circulado n.º 50 000/2012, de 26 de janeiro, da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) são da estrita competência da Direção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspeção Tributária (DSPCIT).

3. Assim, a informação vinculativa a prestar no âmbito do presente pedido ocupar-se-á dos restantes assuntos aludidos pela requerente, nomeadamente os que se inserem na disciplina do imposto, plasmada no respetivo Código (CIVA), e no Regime dos Bens em Circulação, publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 147/2003, de 11 de julho.

4. O mencionado Regime foi objeto de recentes alterações, operadas, em primeira instância, pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, tendo o artigo 10.º deste diploma determinado a sua republicação. Posteriormente, o artigo 200.º da Lei n.º 66-B/2012, 31 de dezembro (que aprovou o Orçamento do Estado para 2013), alterou, ainda, os artigos 4.º, 5.º, 6.º, 8.º, 10.º e 11.º, conferindo-lhe a atual redação, que entrou em vigor em 1 de julho de 2013, por determinação do artigo 9.º da Portaria n.º 161/2013, de 23 de abril.

5. As alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 2.º do Regime define o conceito de bens em circulação, nos seguintes moldes: "a) Consideram-se «bens em circulação» todos os que se encontrem fora dos locais de produção, fabrico, transformação, exposição, dos estabelecimentos de venda por grosso e a retalho ou de armazém de retém, por motivo de transmissão onerosa, incluindo a troca, de transmissão gratuita, de devolução, de afetação a uso próprio, de entrega à experiência ou para fins de demonstração, ou de incorporação em prestações de serviços, de remessa à consignação ou de simples transferência, efetuadas pelos sujeitos passivos referidos no artigo 2,º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado; b) Consideram-se ainda bens em circulação os bens encontrados em veículos nos atos de descarga ou transbordo mesmo quando tenham lugar no interior dos estabelecimentos comerciais, lojas, armazéns ou recintos fechados que não sejam casa de habitação, bem como os bens expostos para venda em feiras e mercados […]."

6. Deste modo, na situação descrita pela requerente, os bens que circulam numa viatura entre o armazém central e os aparelhos de distribuição automática estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regime.

7. Convém referir, a este propósito, os conceitos de remetente e destinatário ou adquirente que se encontram nas alíneas d) e g) do n.º 1 daquele artigo 2.º, como se transcreve: "d) «Remetente» a pessoa singular ou coletiva ou entidade fiscalmemte equiparada que colocou os bens em circulação à disposição do transportador para efetivação do respetivo transporte ou operações de carga, bem como o transportador quando os bens em circulação lhe pertençam; […] g) «Destinatário ou adquirente» a pessoa singular ou coletiva ou entidade fiscalmente equiparada a quem os bens em circulação são postos à disposição".

8. No caso em apreço deve entender-se por destinatário dos bens em circulação a entidade proprietária de cada uma das máquinas de distribuição automática, ou seja, a própria empresa remetente e transportadora, como transparece da exposição da requerente (ponto 1).

9. Um outro aspecto a considerar, eventualmente, é o facto de se desconhecer, à partida do local de início de transporte ou de carga dos bens, a máquina de distribuição automática concreta, que poderemos designar como destinatário físico concreto, que irá receber cada um dos bens transportados. Por outras palavras, não se conhece, no momento em que são processados os documentos de transporte, os abastecimentos efetivos a realizar.

10. Por outro lado, o artigo 1.º (âmbito de aplicação) estabelece que: "Todos os bens em circulação, em território nacional, seja qual for a sua natureza ou espécie, que sejam objeto de operações realizadas por sujeitos passivos de imposto sobre o valor acrescentado deverão ser acompanhados de documentos de transporte processados nos termos do presente diploma."

11. A requerente informa que os bens saem do armazém central (armazém de retém) acompanhados de uma guia global. Este é o procedimento legal previsto no n.º 6 do artigo 4.º do Regime, como se segue: "Os documentos de transporte, quando o destinatário não seja conhecido na altura da saída dos bens referidos no n.º 2 do artigo 2.º, são processados globalmente, nos termos referidos nos artigos 5.º e 8.º, e impressos em papel, devendo proceder-se do seguinte modo à medida que forem feitos os fornecimentos: a) No caso de entrega efetiva dos bens, devem ser processados em duplicado, utilizando-se o duplicado para justificar a saída dos bens; […]"

12. Aquilo que a requerente denomina como "armazém viatura" é tão-só o veículo com recurso ao qual se efetua o transporte dos bens entre o local do seu início ou de carga e o local de destino ou descarga. Neste quadro, nas circunstâncias particulares em que ocorre a operação (ponto 9), o documento que deve acompanhar o percurso dos bens é apenas um, processado globalmente, devendo ser emitidos novos documentos nos termos da alínea a) do n.º 6 do artigo 4.º do Regime, citados no ponto anterior, à medida que se for realizando o abastecimento de cada uma das máquinas.

13. Por sua vez, o n.º 7 deste mesmo artigo impõe que: "Nas situações referidas nas alíneas a) e b) do número anterior, deve sempre fazer-se referência ao respetivo documento global."

14. Do conjunto dos referidos documentos, o processado globalmente e os que são emitidos à medida que se for realizando o abastecimento de cada uma das máquinas, deve ser possível aferir, em qualquer momento, os bens que se encontram em circulação e, bem assim, os que eventualmente retornam ao local do inicio do transporte, no caso às instalações da empresa.

15. Após referência às previsões legais pertinentes, no concernente ao Regime dos Bens em Circulação, aplicáveis à situação tipificada pela requerente, referir-nos-emos, ainda, à previsão legal consignada na alínea b) do n.º 5 do artigo 40.º do CIVA, mencionada no pedido.

16. Aquele artigo 40.º ocupa-se dos preceitos legais a que deve obedecer a emissão de faturas simplificadas. Para uma apreensão completa do alcance da aludida alínea, transcrevemos, seguidamente, na íntegra, o referido n.º 5: "Sem prejuízo da obrigação de registo das transmissões de bens e das prestações de serviços efetuadas, a obrigação referida na alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º pode ser cumprida mediante a emissão de documentos ou do registo das operações, respetivamente, nas seguintes operações: a) Prestações de serviços de transporte, de estacionamento, portagens e entradas em espetáculos, quando seja emitido um bilhete de transporte, ingresso ou outro documento ao portador comprovativo do pagamento; b) Transmissões de bens efetuadas através de aparelhos de distribuição automática que não permitam a emissão de fatura."

17. Como se encontra prescito na alínea b) do o n.º 1 do artigo 29.º do CIVA, os sujeitos passivos de IVA devem: "Emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços".

18. Desta forma, da conjugação da alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º com a alínea b) do n.º 5 do artigo 40.º, ambos do CIVA, infere-se que, quando se trata de operações enquadradas como transmissões de bens efetuadas por meio de aparelhos de distribuição automática que não permitam a emissão de fatura, a obrigação de emitir aquele documento de suporte pode ser cumprida mediante o registo das operações.

19. Clarifica-se que a operação realizada pela máquina de distribuição automárica, a qual se traduz pela venda do café, se qualifica como transmissão de bens e não como prestação de serviços de alimentação e bebidas, uma vez que na mesma não existe a incorporação de trabalho humano que coloque à disposição do cliente, de uma forma personalizada, o produto final, constituído por café, copo, palettine e açúcar.

20. Precisa-se, ainda, que a taxa a aplicar na transmissão de bens referenciada no ponto anterior é a normal, a que se referem os n.ºs 1, alínea c), e 3 do artigo 18.º do CIVA, em conformidade com o consagrado na alínea b) do n.º 4 deste artigo, de harmonia com a qual, quando as mercadorias que compõem a unidade de venda sofram alterações da sua natureza e qualidade ou percam a sua individualidade, a taxa aplicável ao conjunto é a que, como tal lhe corresponder.

21. Em síntese, no caso sob análise, conclui-se que o transporte dos bens entre o armazém central e cada uma das máquinas de distribuição automática, se se desconhecerem as reposições exatas a efetuar em cada uma delas, deve ser acompanhado de um documento de transporte processado globalmente. À medida que os bens forem colocados nessas mesmas máquinas devem ser emitidos novos documentos, em duplicado, que atestem os fornecimentos efetuados e que referenciem o respetivo documento global. Se os aparelhos de distribuição automática, na venda dos bens que contêm, não permitirem a emissão de fatura, a obrigação de faturação pode ser cumprida pelo registo das operações. Aqueles bens devem ser transmitidos à taxa normal.