Doutrina Administrativa
Tributação do consumo

Processo n.º 5754

 

Assunto
Cedência de Exploração – Operação realizada entre entidades religiosas – Sujeita e não isenta
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 29 de Outubro, 2013
Número: 5754
Diploma: CIVA
Artigo: 4.º

Doutrina

Cedência de Exploração – Operação realizada entre entidades religiosas – Sujeita e não isenta

CONTEÚDO: Tendo por referência o pedido de informação vinculativa solicitado, ao abrigo do disposto no art.º 68.º da Lei Geral Tributária (LGT), pelo sujeito passivo Congregação das Irmãs XXX, cumpre prestar a seguinte.

I - Objeto do Pedido de Informação:
1.
A Requerente é sujeito passivo de IVA, do regime normal mensal, misto com afetação real de todos os bens, pelo exercício do CAE principal 94910 (Atividades de Organizações Religiosas).

2. De acordo com o seu pedido, o Colégio YYY (detido pela Requerente) exerce a atividade de ensino escolar até ao 9.º ano de escolaridade, com alvará do Ministério da Educação, estando os serviços prestados aos alunos isentos ao abrigo do art.º 9.º do Código do IVA (CIVA). Estuda a possibilidade de estabelecer um protocolo com um colégio que se encontra nas mesmas condições, o qual "incidirá na cedência de professores, apoio na gestão, cedência de instalações, serviços administrativos e similares".
Neste protocolo ambas as entidades são, simultaneamente, prestadores e adquirentes, sendo remuneradas de acordo com o volume de serviços prestados. Questiona o enquadramento destas operações para efeitos de IVA.

II - Sujeição a Imposto da Cedência de Professores e Isenção do Art.º 9.º, alínea 9)

3. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 1.º do CIVA, "estão sujeitas a IVA as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal".

4. O art.º 4.º do CIVA apresenta um conceito residual de prestação de serviços, considerando como tal "as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens". Trata-se de um conceito económico de prestação de serviços, revelando uma maior abrangência face ao conceito jurídico plasmado no art.º 1154.º do Código Civil. Assim, estão sujeitas a IVA realidades económicas que não correspondem à definição jurídica de prestação de serviços.

5. O possível protocolo institui um acordo de cedência de professores entre duas instituições de ensino, nos termos definidos no ponto 2. do ofício-circulado 30019, de 04/05/2000 desta Direção de Serviços do IVA, sancionado por despacho concordante do Senhor Ministro das Finanças (n.º 384/99-XIII, de 13/10/99), o qual se cita:
1« Com vista à necessária uniformidade de procedimentos comunica-se que por despacho concordante de Sua Ex.ª o Ministro das Finanças (n.º 384/99-XIII, de 13.10.99), foi sancionado o seguinte entendimento:
. Atendendo à natureza residual e, consequentemente, ampla do conceito de prestação de serviços consignado no n.º 1 do art.º 4.º do Código do IVA, em princípio, as operações de cedência de pessoal qualificam-se como operações sujeitas a tributação.

2. Subsumem-se na norma acima citada todas as situações em que materialmente existe uma colocação de pessoal à disposição, independentemente de tais operações se qualificarem, ou não, em termos jurídicos, como sendo de cedência de pessoal e apesar de os respetivos trabalhadores manterem os seus vínculos laborais originários com as correspondentes entidades patronais.

3. Face à doutrina veiculada pelo ofício-circulado n.º 32 344, de 14.10.86, "o simples débito ao Estado, a um sindicato ou outra entidade pública ou organismo sem finalidade lucrativa, da importância correspondente aos vencimentos de um funcionário por esses organismos requisitado, cujo pagamento fora antes efetuado pela empresa, deve considerar-se um simples reembolso de despesas efetuadas, não existindo a prestação de qualquer serviço nem, por conseguinte, a sujeição a IVA".

4. Esta doutrina administrativa, ou seja, a inexistência de prestação de serviços e, consequentemente, a não sujeição a imposto, é igualmente aplicável em todas as situações em que o montante debitado comprovadamente corresponda ao reembolso exato de despesas com ordenados ou vencimentos, quotizações para a segurança social e quaisquer outras importâncias obrigatoriamente suportadas pela empresa a que pertence o trabalhador, por força de contrato de trabalho ou previstas na legislação aplicável (v.g. prémios de seguros de vida, complementos de pensões, contribuições para fundos de pensões, etc.)"

6. Como decorre do ponto 4. citado, na cedência de pessoal, a sujeição a imposto só é afastada, por inexistência de prestação de serviços, "em todas as situações em que o montante debitado comprovadamente corresponda ao reembolso exato de despesas com ordenados ou vencimentos, quotizações para a segurança social e quaisquer outras importâncias obrigatoriamente suportadas pela empresa a que pertence o trabalhador, por força de contrato de trabalho ou previstas na legislação aplicável (v.g. prémios de seguros de vida, complementos de pensões, contribuições para fundos de pensões, etc.)»

7. Não será comum num protocolo de cedência de professores que a remuneração devida pelo cessionário assuma estas características. Pelo contrário, essa remuneração costuma ter por critérios, essencialmente, o número de horas de docência e o número de alunos dos cursos. Realidades essas sem qualquer relação com a remuneração que é devida pela cedente aos seus docentes no âmbito do contrato de trabalho que os vincula.

8. Nestes termos, a cedência de professores está sujeita a IVA, a não ser que cumpra os requisitos rigorosos enunciados no ponto 4. do ofício-circulado 30019.

9. A Requerente faz referência à isenção prevista na alínea 9) do art.º 9.º do CIVA, segundo a qual "estão isentas de imposto as prestações de serviços que tenham por objeto o ensino, bem como as transmissões de bens e prestações de serviços conexas, como sejam o fornecimento de alojamento e alimentação, efetuadas por estabelecimentos integrados no Sistema Nacional de Educação ou reconhecidos como tendo fins análogos pelos ministérios competentes".

10. No entanto, a cedência de professores não pode ser considerada uma prestação de serviço de ensino ou docência. Na realidade, uma prestação de serviços de docência tem como característica distintiva a existência de uma relação professor/aluno e é manifesto que o protocolo previsto não institui tal relação entre as duas instituições de ensino.

11. Constitui serviço de docência o serviço prestado por estas instituições de ensino aos seus alunos, mas essa qualidade não pode ser extensível aos mecanismos de contratação e cedência dos docentes que exercem essa atividade. Pelo contrário, como exposto, o protocolo institui um acordo de cedência de pessoal entre as duas escolas, nos termos definidos no ponto 2. do ofício-circulado 30019, de 04/05/2000.

12. Para efeitos da isenção da alínea 9) do art.º 9.º do CIVA, cumpre ainda saber se a cedência de professores pode ser qualificada como uma prestação de serviços conexa com o ensino.

13. Tem sido entendimento desta Direção de Serviços que são prestações de serviços conexas, "as operações que revistam um caráter de complementaridade em relação às atividades de ensino propriamente dito", como foi decidido, por exemplo, pelo despacho do Subdiretor Geral do IVA de 2010/11/30.

14. No entanto, já "não estarão incluídos neste conceito, por exemplo, os serviços ou as transmissões de bens efetuadas pelo estabelecimento de ensino a funcionários ou a terceiros", conforme despacho da Subdiretora Geral do IVA de 2001/12/03.

15. Aplicando estas orientações, só pode ser entendido que a prestação de serviços em análise não está isenta de imposto pois, não tendo por destinatários os alunos, mas sim um outro estabelecimento de ensino, não pode ser caracterizável como conexa com o ensino.

III - Apoio na Gestão, Cedência de Instalações, Serviços Administrativos e Similares
16.
De acordo com o exposto, o protocolo instituirá não só a cedência de instalações entre as duas instituições, mas também de serviços administrativos e similares.

17. Também estas operações estão sujeitas a imposto, atento o já explicitado conceito amplo de prestação de serviços previsto no n.º 1 do art.º 4.º do CIVA.

18. Ao nível de isenção de imposto, só poderia estar em causa a aplicação da isenção prevista na alínea 29) do art.º 9.º do CIVA, aplicável à locação de imóveis, ficando excluídas as situações previstas nas subalíneas dessa norma.

19. A cedência de instalações pode ser qualificada como locação de imóvel, de acordo com a noção plasmada no art.º 1022.º do Código Civil. No entanto, de acordo com a subalínea c) da alínea 29) do art.º 9.º do CIVA, a isenção aplicável à locação de imóveis não abrange "A locação de máquinas e outros equipamentos de instalação fixa, bem como qualquer outra locação de bens imóveis de que resulte a transferência onerosa da exploração de estabelecimento comercial ou industrial".

20. A administração fiscal tem utilizado um critério preciso que permite distinguir as situações de locação do imóvel pura e simples - mero arrendamento - das outras situações em que esse arrendamento, nas condições em que é realizado, proporciona ao locatário um determinado valor acrescentado.

21. Assim, só se encontra isenta de IVA a locação de bens imóveis para fins habitacionais ou para fins não habitacionais - comerciais, industriais ou agrícolas - quando for efetuada "paredes nuas", no caso de prédios urbanos ou de parte urbana em prédios mistos, ou "apenas o solo" no caso de prédios rústicos.

22. São assim de excluir da isenção todas as situações que, apesar de partilharem alguns dos elementos preponderantes do contrato de locação, se caracterizam essencialmente por integrarem outras prestações de serviços conexas à fruição do imóvel e que implicam uma exploração ativa dos bens imóveis, para além do simples gozo temporário do bem.

23. Ora, o espaço cuja cedência está prevista faz parte das instalações das escolas e vem apetrechado com condições que vão para além do conceito, necessariamente restrito, de "paredes nuas". Mais do que disso, como é informado, a cedência das instalações é acompanhado pela cedência de outros serviços essenciais à prossecução da atividade escolar, designadamente apoio na gestão, serviços administrativos e similares. De tal forma que a materialidade da operação parece consistir na partilha de serviços administrativos e não propriamente no espaço físico em que estes funcionam.

24. Por assim ser, não é aplicável a isenção prevista na subalínea c) da alínea 29) do art.º 9.º do CIVA para a locação de imóveis.

IV - Conclusões:
1.
A não ser que cumpra os requisitos rigorosos enunciados no ponto 4. do ofício-circulado 30019, a cedência de professores (a prever num eventual protocolo a realizar entre as duas escolas) está sujeita a imposto, a título de prestação de serviços, e não isenta. Não beneficia, designadamente, da isenção plasmada na alínea 9) do art.º 9.º do CIVA.

2. A cedência de instalações e de serviços administrativos e similares entre as duas instituições está sujeita a imposto, a título de prestação de serviços, não beneficiando da isenção prevista na alínea 29) do art.º 9.º do CIVA, nem de qualquer outra.