Doutrina Administrativa
Tributação do consumo

Processo n.º 9469

 

Assunto
Localização de operações - Prestação de serviços de advocacia a não residentes em Portugal
Tipo: Informações Vinculativas
Data: 15 de Dezembro, 2015
Número: 9469
Diploma: CIVA
Artigo: 6.º

Doutrina

Localização de operações - Prestação de serviços de advocacia a não residentes em Portugal

Tendo por referência o pedido de informação vinculativa solicitada, ao abrigo do art° 68° da Lei Geral Tributária (LGT), presta-se a seguinte informação.

I - FACTOS APRESENTADOS

1. A requerente questiona o enquadramento em sede de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), da prestação de serviços de advocacia a não residentes em Portugal que, especificamente tenciona realizar, apresentando os factos que sinteticamente se enunciam:

I) "No exercício da sua atividade, a aqui requerente prevê prestar serviços a não residentes estrangeiros extra - comunitários em Portugal;
II) Uma vez que os cidadãos estrangeiros não são titulares de residência em Portugal, são considerados pela AT (…..) como não residentes, mas com número de contribuinte atribuído e com representante legal nomeado;
III) Segundo o art.16.º, n.º1 al. a) do CIRS, "São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos: hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados;"
IV) (…..);
V) Contudo, alguns cidadãos estrangeiros, mesmo após a obtenção do título de residência, optam por não residir em Portugal, uma vez que o art.65.º-C do Dec-Reg 15-A/2015, apenas obriga a uma permanência de 7 dias, no 1.º ano";

Desta forma questiona-se se:

a) No âmbito dos serviços prestados a estrangeiros extra-comunitários para solicitarem autorização de residência junto das autoridades competentes, a fatura a emitir está sujeita ou não a IVA nos termos do disposto no art.º 6.º, n.º 11, al. c) do CIVA, uma vez que ainda não é residente em termos civis e fiscais;
b) No âmbito dos serviços prestados a estrangeiros extra-comunitários e que não fixam residência permanente e habitual em Portugal, se a fatura a emitir está sujeita ou não a IVA nos termos do disposto no art.º 6.º, n.º 11, al. c) do CIVA, uma vez que não são residentes para efeitos fiscais determinado pelo art.º 16.º do CIRS;
c) Qual a opção a escolher no quadro "Regime de IVA" aquando da emissão da fatura."

II - ENQUADRAMENTOS LEGAL E DO CASO CONCRETO

2. Por consulta ao Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes verifica-se que o sujeito passivo exponente se encontra enquadrado, para efeitos de IVA, no regime normal de tributação - periodicidade trimestral, desde 2015/02/01, pelo exercício de "Advogados" - CAE principal 6010.

3. Nos termos do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA, estão sujeitas a este imposto "as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal", definindo o n.º 1 do artigo 4.º o conceito de prestação de serviços como "as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens".

4. Assim, para efeitos deste imposto, estamos perante uma prestação de serviços quando está em causa a "prestação de serviços de advocacia a não residentes em Portugal".

5. Uma vez que a operação subjacente ao contrato celebrado entre os signatários acima identificados tem conexão com ordenamentos jurídicos distintos, in casu, entre o território nacional e países terceiros (ou como é designado na exposição da requerente "serviços prestados a não residentes estrangeiros extra-comunitários") é imperativo determinar o local de tributação da mesma e, porque está em causa uma prestação de serviços, deve ter-se em conta a previsão do artigo 6.º do Código do IVA.

6. As novas regras sobre a localização das prestações de serviços entraram em vigor no dia 1 de janeiro de 2010 e, encontram-se definidas nos n.ºs 6 a 12 do artigo 6.º do Código do IVA (com as alterações introduzidas pelo D.L. 186/2009, de 12 de agosto, que transpôs para o direito interno a Diretiva 2008/8/CE do Conselho, de 12 de fevereiro). O n.º 6 do art.º 6 estabelece duas regras gerais, aplicáveis caso a operação não se enquadre em nenhuma das regras especiais definidas nos números 7 a 12 do mesmo artigo, que são as seguintes:

i) Serviços prestados a um sujeito passivo [alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA] - Esta operação é localizada e tributada no local da sede ou estabelecimento estável para o qual os serviços são prestados ou, na sua falta, do domicílio do adquirente dos serviços (comunitário ou não), independentemente do local onde se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador.
ii) Serviços prestados a não sujeito passivo [alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA] - Esta operação é localizada e tributada no Estado membro da sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, do domicílio do prestador dos serviços.

7. Não obstante o princípio que está subjacente às regras gerais das prestações de serviços, o artigo 6.º continua a contemplar exceções que se encontram consignadas nos seus n.ºs 7 a 12.

8. Uma das exceções encontra-se prevista na alínea c) do n.º 11 do referido artigo 6.º do CIVA, que refere que não obstante o disposto na alínea b) do n.º 6, não são tributáveis as prestações de serviços, nomeadamente de advogados, quando o adquirente for uma pessoa estabelecida ou domiciliada fora da Comunidade.

9. Este preceito refere-se às profissões de consultor, engenheiro, advogado e perito contabilista, que no entendimento do TJUE "tal disposição comunitária não visava genericamente toda e qualquer prestação que fosse realizada por esses profissionais, mas apenas as prestações que são típicas do exercício das referidas profissões". 1)

10. Conforme apontado pelo TJUE no acórdão de 6 de março de 1997 (processo C-167/95, caso Linthorst, Pouwels en Scheren, Colect. p. I-1195, n.º20), "o elemento comum aos serviços (…) é o facto de todos eles se enquadrarem nas chamadas "profissões liberais", muito embora não abranja todas elas, já que, se o legislador comunitário tivesse pretendido incluir todas essas profissões no âmbito da referida disposição, tê-lo-ia indicado de uma forma expressa".

11. No sentido de determinar o âmbito de aplicação das regras de localização, deve-se atender à respetiva finalidade. Assim, conforme ressalta do terceiro considerando da Diretiva 2008/8/CE, que alterou significativamente a Diretiva do IVA em matéria de localização das operações, com efeitos a 1 de janeiro de 2010, "Relativamente a todas as prestações de serviços, o lugar de tributação deverá, em princípio, ser o lugar onde ocorre o seu consumo efetivo." "Contudo, ressalva-se o facto de poderem ser previstas exceções a este princípio geral (…) tanto por motivos administrativos como por motivos políticos." Nos casos em que os destinatários dos serviços são empresas, que desenvolvem uma atividade económica, os serviços adquiridos encontram-se relacionados com a atividade da empresa, sendo, por isso, incorporados na produção de bens ou na prestação de serviços, e incluídos no custo de produção/realização dos mesmos. Nesta medida, afigura-se legítimo considerar que os serviços prestados às empresas são objeto de utilização ou consumo no lugar onde o destinatário dos serviços exerce a sua atividade. Contudo, em conformidade com o disposto no sexto considerando da Diretiva 2008/8/CE, e tal como previsto no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 186/2009, de 12 de agosto, "as regras gerais atrás assinaladas comportam várias exceções, aplicáveis a certos serviços especificamente identificados, os quais, pela sua natureza, atenta a preocupação de assegurar tanto quanto possível, a respetiva tributação no país do consumo, justificam a consagração de critérios de conexão diversos dos que constituem as regras gerais de localização das prestações de serviços".

12. Atendendo a que a requerente refere que a prestação de serviços é efetuada a "cidadãos estrangeiros", residentes fora da Comunidade, tal operação enquadra-se na exceção consignada no n.º 11 do artigo 6.º (esta exceção destina-se a adquirentes particulares fora da Comunidade), pelo que não tem aplicação a regra geral da sede do prestador estabelecida na alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, n ão sendo a prestação de serviços em causa localizada, nem tributada no território nacional.

13. Nestas situações, aquando da emissão da fatura-recibo eletrónica, no regime de IVA, deve selecionar a menção "IVA-autoliquidação" [regras de localização - artigo 6.º (regras específicas)]. Sobre as regras de localização das prestações de serviços pode consultar, no Portal das Finanças, o Oficio-Circulado n.º 30115/2009-DSIVA, de 29 de dezembro.

14. Caso se trate de um adquirente que exerça uma atividade económica fora do território da Comunidade e que desse facto faça prova, a operação continua a não se localizar em território nacional mas por força do artigo 6.º, n.º 6 alínea a) a contrario, e desde que não se enquadre na exceção prevista na alínea a) do n.º 8, do artigo 6.º do CIVA (prestação de serviços relacionados com o imóvel sito em território nacional).

15. Uma última nota para dizer que este tipo de operações não localizadas em território nacional (mas que seriam tributadas se aqui fossem localizadas), devem ser relevadas no campo 8 do quadro 06 da respetiva declaração periódica (não havendo necessidade de entrega do Anexo Recapitulativo) e conferem direito à dedução do IVA suportado para a sua realização, nos termos do ponto II) da alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA.

1) Cf. acordãos de 16 de setembro de 1997 (processo C-145/96, caso Hoffmann, Colect.p.I 4857, n.º15) e de 27 de setembro de 2005 (processo C-41/04, caso Levob Vergekeringen e OV Bank, Colect.p.I-9433, n.º37).