Elementos das demonstrações financeiras
86 - As demonstrações financeiras retratam os efeitos financeiros das transações e outros acontecimentos agrupando-os em grandes agregados conforme as suas características económicas. Estes grandes agregados são designadas como os elementos das demonstrações financeiras.
87 - Os elementos das demonstrações financeiras são os seguintes:
a) Ativos;
b) Passivos;
c) Rendimentos;
d) Gastos;
e) Contribuições para o património líquido; e,
f) Distribuições do património líquido.
Os elementos diretamente relacionados com a mensuração da posição financeira no balanço são os ativos, os passivos, as contribuições para o património líquido e as distribuições do património líquido. Os elementos diretamente relacionados com a mensuração do desempenho na demonstração dos resultados são os rendimentos e os gastos.
O património líquido de uma entidade pública corresponde ao valor agregado dos seus ativos, deduzidos dos passivos, com referência à data do relato financeiro.
1.1 - Definição
88 - Um ativo é um recurso presentemente controlado pela entidade pública como resultado de um evento passado.
89 - Um recurso é um item que contém em si a capacidade de proporcionar um influxo de potencial de serviço ou de benefícios económicos futuros. Esse recurso tem, necessariamente, que ser controlado pela entidade pública, podendo, ou não, assumir substância física. Por outro lado, os benefícios podem ser originados pelo recurso em si próprio, ou pelo direito a dispor desse recurso.
90 - O potencial de serviço consiste na capacidade de um ativo ser utilizado na prossecução dos objetivos da entidade pública, sem que, necessariamente, tenham que ser gerados influxos de caixa ou equivalentes de caixa para a entidade.
91 - Os ativos do setor público que incorporam potencial de serviço podem incluir ativos com fins recreativos, culturais, históricos, comunitários e outros, que são detidos por uma entidade pública com a finalidade de fornecer bens ou prestar serviços a terceiros. Tais bens ou serviços podem ser de consumo coletivo ou individual.
Vários destes serviços podem ser prestados em setores de atividade em que não existe mercado competitivo ou o mesmo é limitado. A utilização destes ativos poderá estar restrita ao setor público, dado que muitos deles incorporam um potencial de serviço muito especializado.
92 - Os benefícios económicos futuros assumem a forma de influxos de caixa ou equivalentes de caixa, ou redução de exfluxos de caixa ou equivalentes de caixa, em resultado designadamente da:
a) Utilização de um ativo para produzir bens destinados à venda, ou prestar serviços remunerados; ou
b) Troca direta de um ativo por caixa ou equivalentes de caixa, ou por outros recursos.
93 - Para reconhecer um ativo, uma entidade pública tem que dispor do controlo sobre o recurso, o qual implica:
a) A capacidade para utilizar o potencial de serviço ou os benefícios económicos provenientes do recurso em causa; ou,
b) A capacidade da entidade pública em determinar a natureza e forma de utilização que outras entidades fazem dos benefícios originados pelo recurso.
94 - O controlo sobre um recurso pode decorrer de diversos meios, pelo que, ao analisar se existe ou não controlo sobre o recurso, a entidade pública deverá considerar os seguintes indicadores:
a) Propriedade legal;
b) Acesso ao recurso, ou a capacidade de restringir o acesso de outras entidades ao mesmo;
c) Existência de meios capazes de assegurar que os recursos são utilizados para atingir os objetivos propostos; e d) A existência de um direito (legal ou outro) ao potencial de serviço ou aos benefícios económicos futuros incorporados no recurso.
Embora estes indicadores não permitam concluir de forma inequívoca sobre a existência de controlo, a sua análise isolada pode contribuir para tal conclusão. Por exemplo, se uma entidade pública não possui a capacidade de evitar o acesso de terceiras entidades a determinado recurso, tal entidade pública poderá não dispor desse ativo.
95 - A definição de um ativo exige que o mesmo seja resultante de um evento passado, seja ele uma transação ou outro tipo de evento. Uma entidade pública pode obter um ativo através de compra, troca ou produção própria.
Para estes casos, a identificação do evento passado é linear.
Os ativos podem também ter origem em transações sem troca, incluindo as que resultem do exercício de poderes soberanos. O poder tributário ou de emissão de licenças, bem como de garantir, limitar, ou negar o acesso a recursos naturais ou minerais, são exemplos de direitos e poderes que entidades não pertencentes ao setor público normalmente não têm. Assim, torna-se essencial determinar em que momento temporal esses direitos e poderes dão lugar à existência de um ativo. Assumindo o exemplo dos impostos, podem-se identificar os seguintes momentos:
a) A capacidade do Estado em tributar;
b) O estabelecimento do direito a tributar determinados eventos;
c) A capacidade de exercer o poder, por forma a criar um direito do Estado a cobrar o imposto; e,
d) A ocorrência do evento que origina, no contribuinte, a obrigação de pagar o imposto.
Assim, o ativo apenas surge quando o poder é exercido e existe o direito de receber os recursos o que, no caso em apreço, se concretiza com a ocorrência do evento referido em (d).
2.1 - Definição
96 - Um passivo é uma obrigação presente originada num evento passado que gera uma saída de recursos.
97 - Uma obrigação presente é uma obrigação vinculativa, de caráter legal ou outro, relativamente à qual a entidade pública tem pouca ou nenhuma probabilidade de evitar a saída de recursos.
98 - Um passivo deve envolver uma saída de recursos da entidade para ser liquidado. Uma obrigação que pode ser satisfeita sem saída de recursos não é um passivo.
99 - A complexidade dos programas e atividades do setor público leva a que, particularmente no que se refere a obrigações cujo caráter vinculativo não decorra de uma obrigação legal, possa tornar-se mais complexa a definição do momento em que a obrigação surge, ou seja, do reconhecimento do passivo. Quando um acordo assume uma forma legal (como, por exemplo, um contrato), essa identificação é mais simples. Quando tal não ocorre, a identificação do evento passado implica a determinação do momento em que a entidade pública tem pouca ou nenhuma probabilidade de evitar a saída de recursos.
100 - As obrigações vinculativas podem ser de caráter legal ou não e terem origem em transações com ou sem contraprestação. Para reconhecimento de um passivo, a obrigação é sempre para com um terceiro, nunca para com a própria entidade pública, mesmo que esta tenha assumido um compromisso firme e público em manter um determinado comportamento. A identificação do terceiro com quem se assumiu a obrigação é um indicador da existência de uma obrigação que origina o reconhecimento de um passivo. No entanto, não é essencial conhecer a exata identidade do terceiro antes da data da liquidação, para que exista efetivamente uma obrigação presente e seja reconhecido um passivo.
101 - Uma obrigação legal encontra-se geralmente definida na legislação em vigor, independentemente da forma que esta assuma. Quando assim é, não podem existir dúvidas de que a entidade pública não tem alternativa realista de evitar a obrigação e que por isso existe um passivo.
102 - Os passivos podem, também, ter origem em outras obrigações vinculativas. Estas diferem das obrigações de caráter legal, na medida em que a parte para com quem existe a obrigação, não pode socorrer-se da legislação para obrigar à sua liquidação. Uma obrigação vinculativa assume os seguintes atributos:
a) A entidade pública deu sinais claros de aceitar certas responsabilidades, seja mediante a criação de padrões de conduta no passado, políticas internas devidamente divulgadas ou pronunciamentos específicos nesse sentido;
b) Em resultado dos comportamentos referidos em (a), a entidade pública criou expetativas válidas em terceiros, que cumprirá os compromissos assumidos; e,
c) A entidade pública tem reduzida ou nenhuma alternativa realista de evitar a liquidação da obrigação decorrente dos compromissos assumidos.
3.1 - Definições
103 - Rendimentos são aumentos no património líquido, que não sejam os resultantes de contribuições para o património líquido.
104 - Gastos são diminuições no património líquido, que não sejam as resultantes de distribuições do património líquido.
105 - Os rendimentos e os gastos podem ter origem em transações com contraprestação, ou sem contraprestação, ou em outros eventos, como sejam, alterações de preços, oscilações (não realizadas), positivas ou negativas, nos valores de ativos e ou passivos, a realização de ativos através da sua depreciação ou amortização e a erosão do potencial de serviço ou dos benefícios económicos futuros através da ocorrência de situações de imparidade.
Os rendimentos e os gastos podem surgir de transações individuais ou grupos de transações.
106 - Os resultados do período são a diferença entre rendimentos e gastos relatados na demonstração dos resultados.
107 - As contribuições para o património líquido de uma entidade pública são influxos de recursos, efetuados por entidades externas na sua condição de proprietários, que estabelecem ou reforçam o seu interesse no património líquido dessa entidade pública.
108 - As distribuições do património líquido de uma entidade pública são exfluxos de recursos, entregues a entidades externas na sua condição de proprietários, que extinguem ou reduzem o seu interesse no património líquido dessa entidade pública.
109 - É essencial distinguir os rendimentos e gastos dos influxos de recursos dos proprietários e exfluxos de recursos para os proprietários. Para além das entradas de recursos e saídas de dividendos que possam ocorrer, é relativamente comum que sejam transferidos ativos e passivos entre diferentes entidades públicas. Quando tais transferências satisfazem a definição de contribuições para o património líquido e distribuições do património líquido, serão contabilizadas como tal.
110 - A figura do proprietário do património líquido pode surgir sempre que uma entidade pública contribui com recursos para que uma outra entidade inicie a sua atividade. No setor público, as contribuições para o património líquido e as distribuições do património líquido, estão muitas vezes relacionadas com reestruturações orgânicas das administrações públicas, assumindo a forma de transferências de ativos e passivos, ao invés de transações envolvendo caixa e equivalentes de caixa. A detenção de património líquido pode assumir diferentes formas, que não a de um instrumento de capital próprio.
111 - As contribuições para o património líquido criam ou reforçam, para o proprietário, um direito a ser remunerado pelo seu investimento, podendo assumir a forma de uma entrada inicial de recursos para criação de uma entidade pública, o reforço subsequente de recursos, incluindo os casos de reestruturação da entidade pública. As distribuições de património líquido podem decorrer de remuneração do investimento, reembolso (devolução) do investimento ou a devolução total ou parcial do património líquido, nos casos de dissolução ou reestruturação da entidade pública.