O presente decreto-lei, na sequência da autorização legislativa conferida pelo artigo 98.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, visa concretizar uma orientação fundamental do Programa do XVII Governo Constitucional respeitante ao reforço da eficácia no combate à fraude e à evasão fiscais, designadamente mediante a adopção de medidas que estejam em linha com as melhores práticas europeias e internacionais.
Entre as medidas que têm vindo a ser desenvolvidas noutros sistemas jurídicos, designadamente nos Estados Unidos da América, no Reino Unido e no Canadá, com vista a reforçar o combate à evasão fiscal, bem como à própria fraude, destaca-se a consagração de obrigações de comunicação, informação e esclarecimento à administração fiscal sobre esquemas ou actuações de planeamento fiscal agressivo que são propostos, promovidos e comercializados por diversas entidades, genericamente apelidadas de intermediários fiscais.
Todos os sistemas fiscais modernos assentam na exigência do fornecimento de informações pelos sujeitos passivos, avultando desde logo a obrigação básica de apresentar declarações sobre os elementos fiscalmente relevantes.
Verifica-se actualmente, porém, que as obrigações de prestação de informações sobre factos tributários e matérias conexas devem ultrapassar o estrito campo dos contribuintes e de certos terceiros delimitados para passarem a incidir igualmente sobre as entidades que prestam serviços de consultoria no campo fiscal, dada a sua importância crescente na definição da actuação dos sujeitos passivos de imposto.
A declaração de Seoul de Setembro de 2006, resultante de reunião de diversas administrações fiscais promovida pela OCDE, referiu-se expressamente ao desenvolvimento crescente e muito rápido de esquemas de planeamento fiscal agressivo e à ligação entre tais práticas inaceitáveis de minimização fiscal e a intervenção dos intermediários fiscais, como sejam consultores fiscais e entidades financeiras.
Os resultados provenientes do exercício da consultoria fiscal no que concerne à afectação do cumprimento pontual e exacto dos deveres fiscais assumiu já proporções absolutamente preocupantes, fruto da intensa concorrência entre as diversas entidades que prestam serviços neste domínio, com criação permanente de esquemas pré-fabricados de planeamento fiscal para oferta a clientes e demais interessados, com práticas de modelos de preços extraordinariamente lucrativos assentes na ligação entre a remuneração e o montante da vantagem fiscal proporcionada, bem como com recurso à configuração de instrumentos e produtos financeiros muito complexos e sofisticados.
Ora, o fenómeno do planeamento fiscal agressivo ou abusivo, promovido por estes intermediários fiscais, gera efeitos desfavoráveis muito significativos, pois corrói a integridade e a justiça dos sistemas fiscais, desencoraja o cumprimento por parte da generalidade dos contribuintes e aumenta injustificadamente os custos administrativos de fiscalização da máquina fiscal.
O exercício da consultoria no campo tributário tem, então, vindo a ser desenvolvido sem qualquer forma de regulação, não se encontrando muitas vezes sequer uma qualquer manifestação de preocupação com as fronteiras da actuação ilícita que podem estar a ser atravessadas ou com o princípio material fundamental da justiça na repartição efectiva dos encargos tributários. Muitos intervenientes neste sector de actividade concebem mesmo a sua missão, não como a promoção do cumprimento da lei fiscal e de erradicação do seu incumprimento, mas antes como a exploração sem limites nem peias das fragilidades da lei fiscal, mesmo que em desconformidade com o plano e o espírito legislativo.
Naturalmente, pelos proventos que assim têm obtido, estes promotores pretendem proteger ciosamente a actual e desregrada forma de desenvolver a sua actividade, bem como o know how entretanto adquirido, não obstante as graves repercussões económicas e sociais que para a comunidade no seu todo advêm da respectiva actuação.
Justamente, a consagração pelo presente decreto-lei em relação a esquemas ou actuações de planeamento fiscal, que possuam as características constantes dos artigos 3.º e 4.º, de obrigações de comunicação, informação e esclarecimento, tais como previstas nos artigos 7.º, 8.º e 9.º, visa produzir um importante e significativo efeito de regulação das actuações com efeitos abusivos das entidades promotoras de tais esquemas (entidades essas que são objecto de caracterização pelo artigo 5.º), porquanto possibilita a percepção social de que as lacunas legislativas serão preenchidas em conformidade com o programa do legislador e com o princípio da igualdade, e que as posições fiscais dúbias e abusivas dos contribuintes e demais sujeitos passivos serão devidamente expostas, prevenidas e combatidas, designadamente pelos procedimentos próprios anti-abusivos.
Trata-se, em suma, de consagrar um novo regime que assenta, fundamentalmente, na consagração de deveres de informação à administração fiscal tendo em conta que o funcionamento regular, eficaz, íntegro e justo do sistema fiscal também depende fortemente da informação que lhe seja reportada, em tempo oportuno.
De qualquer modo, em atenção à sua novidade, a disciplina instituída é muito prudente, o que se manifesta logo no facto de se dirigir unicamente ao conhecimento pela administração fiscal dos esquemas ou actuações de planeamento fiscal considerados em si mesmos e de modo abstracto (artigo 8.º). Deste modo, as obrigações instituídas não se destinam a determinar a identificação dos utilizadores de esquemas ou actuações de planeamento fiscal (n.º 2 do artigo 8.º), o que apenas tem lugar quando o conhecimento desses esquemas ou actuações não pode ser obtido senão junto dos próprios utilizadores (artigo 10.º).
A revelação dos esquemas ou actuações de planeamento fiscal prevista no presente decreto-lei possibilita, assim, melhorar a transparência e a justiça do sistema fiscal, assegurando-se ao mesmo tempo que os custos administrativos relacionados com estas obrigações não assumem significado relevante dado incidirem, fundamentalmente, apenas sobre as entidades que promovem junto de terceiros a utilização desses esquemas e que, portanto, têm deles perfeito conhecimento.
O presente decreto-lei visa, portanto, objectivos de promoção do interesse nacional em atenção ao papel fundamental que a liquidação e cobrança das receitas tributárias devidas nos termos da lei assume para o desenvolvimento económico e social.
Evidentemente, é fundamental que todos, particulares e empresas, na sua qualidade de contribuintes ou fora dela, tenham plena consciência e assumam na prática que representa um essencial dever de cidadania que cada um pague todos os impostos que são devidos nos termos da lei. Com a disciplina agora instituída dá-se igualmente mais um passo no sentido da plena radicação na comunidade nacional deste elementar princípio de justiça e solidariedade.
Foram promovidas as diligências necessárias à audição da Ordem dos Advogados, da Câmara dos Solicitadores, da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, da Associação Portuguesa de Bancos, da Associação Portuguesa de Seguradores, do Banco de Portugal, do Instituto de Seguros de Portugal e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
Foi ouvida a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida no artigo 98.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

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